quarta-feira, 20 de julho de 2011

EDUCAÇÃO INCLUSIVA – HISTÓRICO E REFLEXÕES

Maria Helena da Silva Meller

O presente texto é decorrente da Disciplina Educação Inclusiva desenvolvida no curso de Pós Graduação em Supervisão, Orientação e Gestão Escolar na Instituição Esucri – Criciúma/ SC. O material está relacionado à história e análise do contexto social em que se vislumbra a inclusão escolar.
A educação de um povo, em sentido amplo, desenvolve-se de acordo com sua construção histórica e cultural. No que se refere à educação escolar sua sistemática conforme a conhecemos, no Brasil, atualmente é bastante recente, haja vista, em nível de legislação ser citada em 1934 com a área da saúde.
A partir de dados obtidos no preâmbulo da Constituição Federal Brasileira 1988, onde busca assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça fundada na harmonia social com a solução pacífica das controvérsias, nos Princípios Fundamentais, entre eles o da cidadania, a dignidade da pessoa humana a de construir uma sociedade livre, justa e solidária é possível fazer algumas reflexões sobre a educação escolar. Visto esta acontecer em um cenário complexo e, por vezes, contraditório.
O ser humano em seu desenvolvimento histórico sempre buscou sanar suas necessidades. Por seu aspecto social, procura e procurou viver em grupo. Grupos estes formados por características semelhantes. Portanto, o diferente era percebido como algo estranho. Tratando, portanto de Educação Inclusiva traremos para a discussão os sujeitos descritos como diferentes. Diante disso, muito antes de Cristo os considerados “diferentes” ou inaptos para conviver em grupo eram descartados da vida social. Em determinado momento sendo mortos, mais além, sendo escondidos em mosteiros.
Com a declaração Universal dos Direitos Humanos, historicamente trazendo, muito recente, 1948, há uma concordância de que entre todos os seres humanos não há determinadas distinções, pois apresentam os mesmos diretos.
Quando se trata do termo educação não podemos nos limitar à escola, pois esta é uma necessidade relativamente recente. Ou pelo menos a escola popular, com acesso a todos. Contudo, esse TODOS não incluía os diferentes, aqueles que não acompanhavam os conteúdos escolarizados.
A psicologia e outras ciências, sempre estiveram neste cenário, todavia é um campo complexo, haja vista tratar de uma questão dessa natureza, dentro de um sistema capitalista, onde a norma vigente é a produção. Aqui estamos diante de distintas correntes da sociologia, antropologia. Pois a cultura em que o sujeito se desenvolve é farta o suficiente para aceitar os costumes e valores já instituídos quando o indivíduo vem ao mundo. Sendo, ainda, fomentada em seu cotidiano, esta prática. Ou seja, quando este cidadão tem condições de fazer a análise de quais conceitos vem ao encontro da cidadania, esse, também, já está “contaminado”, para fazer o distanciamento epistemológico necessário e tomar sua posição, portanto aqui, entramos no campo da política.
Neste cenário está o professor brasileiro, com sua formação fragmentada, devido aos aspectos que influenciam na composição de um sistema educativo: político, histórico, cultural, relação de poder, economia, entre outros.
Os termos utilizados para mencionar os diferentes são bastante variados e vão se modificando ao longo da história da humanidade. Retardados, loucos, deficientes, portadores de necessidades, enfim, cada grupo a partir de seus estudos atribui uma designação para estas pessoas. E isto está carregado de ideologias, pois a prática humana não é neutra.
As declarações de Salamanca 1994, Montreal2004, Madrid 2002, em nível mundial, oferecem um novo ritmo, e conseguem muitos avanços no que se refere a leis indicando a transformação dos cenários, para que esse sujeito seja, de fato, incluído e não mais integrado. Ou seja, o sujeito, dentro de suas possibilidades desenvolverem-se, percebendo suas potencialidades e habilidades. Portanto, cidades capazes de abrigar, com mais propriedade e autonomia de deslocamento todos os cidadãos.
O Brasil em sua Lei de Diretrizes e Bases 1996, Lei de acessibilidade 2000, e decretos daí decorrentes institui uma nova concepção de que os deficientes possuem suas habilidades e possibilites e, assim sendo, essas devem ser desenvolvidas e encorajadas.
Corroborando, neste sentido, a Proposta Curricular/SC (2005) a qual se posiciona teoricamente na concepção sócio histórica, aprovisionando um arcabouço capaz de sustentar uma metodologia por meio da compreensão da plasticidade cerebral, propõe às escolas uma certeza de que é possível investir na educação daqueles considerados deficientes. Isto implica em estudos, antes disso, na aceitação das possibilidades.
Conhecer as demandas atuais e futuras é tarefa da escola atual As instituições de ensino estão inseridas em um contexto constituído por múltiplos fatores, mesmo com planejamento, ainda, são imprevisíveis, e por que não dizer provisórios em muitas circunstâncias improvisados. Caracterizando como oportunidade em fazer da escola uma instituição que necessita conhecer a sua missão, suas metas e objetivos, fornecendo pistas à nova geração de um mundo contraditório, no entanto “contaminado” por seres humanos.
No que tange ao texto, ora elaborado, é possível inferir que, mesmo em um sistema capitalista, sua Constituição indica os princípios democráticos de educação, portanto há que se diluir os discursos das limitações e conhecer de fato as possibilidades.
É importante salientar, destarte, embora dois encontros em um curso de pós graduação é apenas um anúncio do que se deve estudar para poder exercer o papel de docente no século XXI
Neste caso, a gestão escolar, equipe diretiva e todo o corpo docente tomar conhecimento de todas as leis em vigor, ainda ter um consciência do coletivo humano, perceber que é por meio das diferenças que nos constituímos como sujeitos. Que a diversidade enriquece a espécie humana. O docente atual necessita despir-se de toda forma de preconceito, se perceber também em sua individualidade, ou seja, que também é diferente das demais pessoas, para então, poder exerce as suas atribuições, de fato, que lhe são outorgadas pela legislação e legitimadas pela expectativa social. Há que possuir uma formação ampla, não somente pedagógica no sentido estrito, não obstante em sentido vasto, apreendendo a educação não somente em seus aspectos escolares, destarte como um conjunto de saberes necessários que garante a subsistência de nossa espécie.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Avaliação do processo Ensino Aprendizagem

Avaliação do processo Ensino Aprendizagem
Professora Maria Helena da Silva Meller


A avaliação escolar vem sendo discutida em todas as instâncias educacionais, no entanto a sua prática leva o professor a resistir às mudanças emanadas dos avanços determinados pelos novos paradigmas e, também, decorrentes da própria legislação.
Na ação de avaliar deve-se refletir sobre todos os elementos que compõem o processo ensino aprendizagem, pensar na própria prática para poder tomar uma atitude para o presente e para o futuro. Portanto, o ato de avaliar é processual.
Neste sentido, o ato de avaliar implica em novo olhar para o próprio ato de planejar. O planejamento precisa ser modificado, a proposta metodológica deve ser adequada à nova proposta de planejamento em função da nova compreensão do processo de ensinar.
O processo de ensinar é ressignificado porque há um novo entendimento sobre a aprendizagem, concebendo-a da forma interativa, participativa, todavia com rigor. Esse rigor, no entanto, não pode mais acontecer de forma arbitrária, deverá ser construído de forma coletiva, levando o grupo a compreender a sua necessidade.
Neste contexto, os instrumentos avaliativos deixam de ser ferramentas coercitivas, passam a ser instrumentos necessários para o diagnóstico dos elementos que envolvem o processo educativo. A “prova”, nesta concepção, passa a ser mais uma oportunidade de aprendizagem, inclusive para o professor, pois a própria “prova” precisa ser estudada e revista, no sentido de aprimorá-la.
Esses avanços vêm permeando o discurso do professor, no entanto a prática ainda está distante da necessária. Tradicionalmente a avaliação vem sendo desenvolvida em um sentido unilateral, ou seja, o professor avaliando o aluno, ou de forma mais clara, classificando e quantificando o aluno por meio de nota. No caso a avaliação é concebida como um fim em si mesmo.
O professor necessita enfrentar-se, aceitar-se em seus limites para poder propor uma nova postura diante deste processo de avaliar. Para tanto, a participação em palestras, seminários e as leituras são fundamentais ao professor. Destarte, também é fundamental que aceite com humildade que tudo muda, não é simplesmente aceitar o novo por ser novo, mas segundo Paulo Freire, na medida em que lhe é útil.
Devemos respeitar a trajetória histórica do ato de avaliar na educação, contudo devemos pautar o nosso fazer pedagógico no presente, desenvolvendo aprendizagens significativas para o sujeito, para a sua vida cotidiana.


AVALIAÇÃO NA LDB 9394/96 – ARTIGO 24

A verificação do rendimento escolar observará os seguintes critérios:
a. avaliação contínua e cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais;
b. possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar;
c. possibilidade de avanço nos cursos e nas séries mediante verificação do aprendizado;
d. aproveitamento de estudos concluídos com êxito;
e) obrigatoriedade de estudos de recuperação, de preferência paralelos ao período letivo, para os casos de baixo rendimento escolar, a serem disciplinados pelas instituições de ensino em seus regimentos.

 ALGUNS EQUIVOCOS COM RELAÇÃO À AVALIAÇÃO:
• Tornar a avaliação somente como um ato de aplicar provas, atribuir notas e classificar os alunos;
• Utilizar a avaliação como recompensa aos bons alunos e punição para os desinteressados e indisciplinados;
• O professor confiar demais em seu “olho clínico”, dispensando verificações (provas, produções escritas) no decorrer das aulas;
• Professores que rejeitam as mediadas quantitativas de aprendizagem (provas, produção de trabalhos científicos, etc...) em favor dos dados qualitativos (participação nas aulas, relacionamento interpessoal, etc..).

 Conceito:
“A prática da avaliação da aprendizagem, para manifestar-se como tal, deve apontar para a busca do melhor de todos os educandos, por isso é diagnóstica, e não voltada para a seleção de uns poucos, como se comportam os exames. Ela é inclusiva, democrática e amorosa. (...) Não há chegada definitiva, mas sim travessia permanente, em busca do melhor. Sempre!” Cipriano Carlos Luckesi - UFBA

Importante: A avaliação deve utilizar instrumentos e critérios coerentes com a metodologia, os objetivos e os conteúdos desenvolvidos. Jamais utilizar um instrumento, bem como uma estrutura nova na hora da prova, sem que tenha sido trabalhado em sala de aula anteriormente.
Ao definir um critério, por exemplo, PARTICIPAÇÃO, o professor deve já prever os indicadores, ou seja, o que indica que o aluno participa. Isto com antecedência e transparência. Os alunos devem saber de que forma estão sendo avaliados. Os critérios não podem mudar no decorrer do processo de forma eventual pelo professor, sem que haja uma justificativa pedagógica, no caso utilizar o critério como castigo.

Prova operatória:

 É um instrumento que possibilita ao aluno demonstrar os conhecimentos construídos ao longo do processo de aprendizagem.
• Pode ser composta por perguntas ou problemas. Deve contextualizar a questão, ter parametrização, levar à escrita e a leitura e não a pura memorização.
As questões devem ser formuladas utilizando-se palavras operatórias. Ex: Analise, classifique, compare, critique, imagine, serie, levante hipótese, justifique, explique, interprete, suponha, reescreva, descreva, localize, opine, calcule, determine, comente, substitua, exponha, construa, relacione, sintetize e outras.

Referências:

HADJI, Charles. A AVALIAÇÃO DESMISTIFICADA. Porto Alegre: Artmed, 2001. HOFFMANN, Jussara. AVALIAÇÃO MEDIADORA: UMA PRÁTICA EM CONSTRUÇÃO DA PRÉ ESCOLA À UNIVERSIDADE. Porto Alegre 2001.
LUCKESI, Cipriano Carlos. O QUE É MESMO O ATO DE AVALIAR A APRENDIZAGEM? Porto Alegre. 2000.
MORETTO, Vasco Pedro. PROVA UM MOMENTO PRIVILEGIADO DE ESTUDO. RJ,DP&A, 2004.
ROMÃO, José Eustáquio. AVALIAÇÃO DIALÓGICA: DESAFIOS E PERSPECTIVAS. 2 ed. São Paulo: Ed. Cortez, 1999.
RABELO, Edmar Henrique. AVALIAÇÃO: NOVOS TEMPOS, NOVAS PRÁTICAS. Petrópolis. Ed. Vozes, 1999.
WEFFORT, Madalena Freire. AVALIAÇÃO E PLANEJAMENTO. Série Seminários. Espaço Pedagógico. 1997.
VASCONCELOS, Celso dos S. AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM – PRATICAS DE MUDANÇA: 3 ed. São Paulo: Libertad 1998.

A Necessidade do Planejamento na prática Escolar

The importance of school planning
                                                                      Maria Helena  

          Planejar faz parte das atividades humanas, pois planejar significa estudar uma situação, refletir sobre a mesma, ou seja, há uma operação mental neste ato de estudo. Em qualquer atividade planejamos, inclusive quando compramos um par de sapatos: verificar modelos, preços e necessidade da aquisição.
          O planejamento está presente em todas as atividades escolares, mesmo que não haja consciência disto. Houve uma intenção, houve planejamento. Ainda que não seja escrito. A importância do registro se dá pela pela necessidade de se "fazer" memória.
          O Projeto Político-pedagógico (PPP) é um planejamento que, neste caso, envolve toda a escola: professores, direção, pais, funcionários e estudantes. Este processo é fundamental, pois é elaborado um diagnóstico, verificando as necessidades da escola para poder prever metas e ações. O PPP é mais que o documento pronto é, portanto, o movimento de estudo, onde a escola se posiciona filosófica e pedagogicamente diante da realidade.
        O ato de planejar permite ao professor a organização de seus tempos e espaços, pois, normalmente, leciona em mais de uma turma e mais de uma escola. Permite, ainda, que não caia na improvisação, proporcionando mais segurança ao docente.
        O desenvolvimento de um planejamento implica em prever uma forma de avaliação do mesmo, quer em um plano geral da escola, quer na especificidade de um professor com o seu plano de ensino. Avaliar o plano significa analisá-lo em todos os seus aspectos, nos seus múltiplos elementos: objetivos, professores, alunos, metodologia e a própria avaliação. Caso contrário, a avaliação cairá somente sobre o aluno em seu aspecto cognitivo, no domínio de conteúdos.
        Avaliação e planejamento são processos imbricados um no outro, não há planejamento que não tenha passado por uma avaliação de realidade. Como não há avaliação que não tenha sido planejada.


Planejar requer sempre:
 Um estudo apurado acerca da realidade;
 Elaboração de um diagnóstico;
 Indicação das necessidades;
 Proposta de objetivos a médio e longo prazo;
 Elaboração de uma metodologia condizente;

Portanto, exige resposta às perguntas:
 Quem planeja?
 Por que planejar?
 Para que e a quem se planeja?
 Como se planeja?

Ao planejar uma aula o professor deve levar em conta:
 O PPP da escola;
 As características e necessidades dos alunos;
 Os objetivos gerais de sua disciplina;
 A observação da adequação dos conteúdos com a metodologia;
 A previsão de avaliação;
 As condições concretas da escola;

Questões norteadoras para a elaboração do Marco Pedagógico:

1. Qual a importância da disciplina que você leciona na vida/formação de um sujeito?
2. Quando e por que (esta disciplina) passou a fazer parte do currículo escolar?
3. De que forma esta disciplina se articula ao PPP e demais documentos pertinentes?
4. Quais são os objetivos gerais desta disciplina?
5. Os objetivos por série/fase/módulo/bloco?
6. Diante disso, que conteúdos favorecem tais objetivos? Citar.
7. Qual a metodologia mais indicada para trabalhar com esta faixa etária? Fundamente.
8. Qual a proposta de avaliação mais coerente? Explique. Indique os critérios e instrumentos necessários?
9. Referências:
Obs- as perguntas servem como base para o desenvolvimento do texto.

Questões norteadoras para a elaboração de um plano de aula:

1. Indicar os Pontos de observação:
2. Descrever o(s) objetivo(s) da aula (operações mentais)
3. Conteúdos
4. Recursos e técnicas
5. Avaliação – técnicas, instrumentos, indicadores
6. Tarefas para os alunos
7. Encaminhamentos para as próximas aulas (o que o professor já pode prever).

Questões norteadoras para a elaboração de projeto:

1. Tema: (decorrente de uma problemática ou algo que chama atenção do grupo)
2. Subtemas: o grande tema pode ser dividido em pequenos temas
3. Justificativa: qual a importância em estudar este tema, o por que?
4. Objetivo geral: para que? O que se pretende alcançar com este estudo?
5. Objetivos específicos (pode ser de acordo com os subtemas)
6. Fundamentação teórica: o que os autores trazem sobre este item.
7. Metodologia: de que forma se pretende trabalhar, justificando teoricamente, características e necessidades da faixa etária envolvida.
8. Avaliação: como saber se os objetivos estão sendo alcançados, quais critérios, indicadores e instrumentos serão utilizados.


Referências:
GANDIN. Danilo. A prática do planejamento participativo. Petrópolis. Vozes. 2001.
LUCKESI, Cipriano Carlos. o que é mesmo o ato de avaliar a aprendizagem? Porto Alegre. 2000.
MELCHIOR, Maria Celina. avaliação pedagógica: função e necessidade. 2.ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1999. 150 p.
MENEGOLLA, Maximiliano . SANTANNA, Ilza Martins. Por que planejar? Como Planejar? Petrópolis. Vozes. 2000.
ROMÃO, José Eustáquio. avaliação dialógica: desafios e perspectivas. 2 ed. São Paulo: Ed. Cortez, 1999. 136p.
VASCONCELOS, Celso dos S. avaliação da aprendizagem – praticas de mudança: 3 ed. são paulo: libertad 1998.

domingo, 17 de julho de 2011

OBSERVAÇÃO REGISTRO E REFLEXÃO

1. EDUCANDO O OLHAR DA OBSERVAÇÃO
(Madalena Freire)

Aprendizagem do olhar

Não fomos educados para olhar pensando o mundo, a realidade, nós mesmos. Nosso olhar cristalizado nos estereótipos produziu em nós paralisia, fatalismo, cegueira.
Para romper esse modelo autoritário, a observação é a ferramenta básica neste aprendizado da construção do olhar sensível e pensante.
Olhar que envolve ATENÇÃO e PRESENÇA. Atenção que, segundo "Simone Weil" é a mais alta forma de generosidade. Atenção que envolve sintonia consigo mesmo, com o grupo. Concentração do olhar inclui escuta de silêncios e ruídos na comunicação.
O ver e o escutar fazem parte do processo da construção desse olhar. Também não fomos educados para a escuta. Em geral não ouvimos o que o outro fala, mas sim o que gostaríamos de ouvir. Neste sentido, imaginamos o que o outro estaria falando... Não partimos de sua fala, mas de nossa fala interior. Reproduzimos desse modo, o monólogo que nos ensinaram.
O mesmo acontece em relação ao nosso olhar estereotipado, parado, querendo ver só o que nos agrada, o que sabemos, também reproduzindo um olhar de monólogo. Um olhar e uma escuta dessintonizada, alienada da realidade do grupo. Buscando ver e escutar não o grupo (ou o educando) real, mas o que temos na nossa imaginação, fantasia - a criança do livro, o grupo idealizado.
Ver e Ouvir demanda implicação, entrega ao outro.
Estar aberto para vê-Io e/ou ouvi-Io como é, no que diz, partindo de suas hipóteses, de seu pensar. É buscar a sintonia com o ritmo do outro, do grupo, adequando em harmonia ao nosso.
Para tanto, também necessitamos estar concentrados com nosso ritmo interno. A ação de olhar e escutar é um sair de si para ver o outro e a realidade segundo seus próprios pontos de vista, segundo sua história.
Só podemos olhar o outro e sua história se temos conosco mesmo uma abertura de aprendiz que se observa (se estuda) em sua própria história.
Neste sentido, a ação de olhar é um ato de estudar a si próprio, a realidade, o grupo à luz da teoria que nos inspira. Pois sempre "só vejo o que sei" (Jean Piaget). Na ação de se perguntar sobre o que vemos é que rompemos com as insuficiências desse saber; e assim, podemos voltar à teoria para ampliar nosso pensamento e nosso olhar.
Este aprendizado de olhar estudioso, curioso, questionador, pesquisador, envolve ações exercitadas do pensar: o classificar, o selecionar, o ordenar, o comparar, o resumir, para assim poder interpretar os significados lidos. Neste sentido o olhar e a escuta envolvem uma AÇÃO altamente movimentada, reflexiva, estudiosa.
Neste processo de aprendizagem venho constatando alguns movimentos na sua construção:
● o movimento de concentração para a escuta do próprio ritmo, aquecimento do próprio olhar e registro da pauta para a observação. O que se quer observar, que hipóteses se quer checar, o que se intui que não se vê, não se entende, não se sabe qual o significado, etc.;
● o movimento que se dá no registro das observações, seguindo o que cada um se propôs na pauta planejada. Onde o desafio está em sair de si para colher os dados da realidade significativa e não da idealizada;
● o movimento de trazer para dentro de si a realidade observada, registrada, para assim poder pensá-la, interpretá-la. É enquanto reflito sobre o que vi, que a ação de estudar extrapola o patamar anterior. Neste movimento podemos nos dar conta do que ainda não sabemos, pois iremos nos defrontar com nossas hipóteses adequadas e inadequadas e construir um planejamento do que falta observar, compreender, estudar.
Este planejamento aponta para dois movimentos:
Um, que vai lidar com a construção da nossa pauta de observação segundo os movimentos já mencionados para sua construção. Ou seja, a observação avalia, diagnostica a zona real do conhecimento para poder, significativamente, lançar (casando conteúdos da matéria com conteúdos do sujeito, da realidade) os desafios da zona proximal do conhecimento a ser explorado.
Outro que concentra-se na devolução (sair de si, outra vez...) para construção de propostas de atividades (enraizadas nas observações feitas para o grupo onde novos desafios irão ser trabalhados).
Podemos concluir, portanto, que o ato de observar envolve todos os outros instrumentos: a reflexão, a avaliação e o planejamento, pois todos se intercruzam no processo dialético de pensar a realidade.

DIRECIONANDO O OLHAR
O instrumento da observação apura o olhar (e todos os sentidos) tanto do educador quanto do educando para a leitura diagnóstico de faltas e necessidades da realidade pedagógica.
Para objetivar esse aprendizado o educador direciona o olhar para três focos que sedimentam a construção da aula:
 o foco da aprendizagem individual e/ou coletiva;
 o foco da dinâmica na construção do encontro;
o foco da coordenação em relação ao seu desempenho na construção da aula.
Por que é necessário focalizar o olhar? Olhar sem pauta se dispersa. Olhar pesquisador tem planejamento prévio da hipótese que se vai perseguir durante a aula, em cada um desses três focos.
No início desse aprendizado, em qualquer grupo, é adequado ter somente um foco para priorizar, ou na aprendizagem, ou na dinâmica ou na coordenação. Dado como suposto a grande dificuldade de concentração do olhar, do pensamento e da participação ao mesmo tempo, é aconselhável priorizar um foco por vez.
No foco da aprendizagem o desafio do educador é lançar questões que cercam a observação do educando em relação ao seu próprio processo (ou do grupo) de aprendizagem. Questões como:
- Que momentos de mal estar eu vivi no decorrer da aula? – O que de mais significativo constatei que sei e que não sei? etc. Com estas questões lançadas no início do encontro - e que serão no final retomadas na avaliação da aula -, o desafio é obrigar o educando a construir um distanciamento (reflexivo) sobre seu processo de aprendizagem durante o desenvolvimento da aula.
Já que estas questões lançadas no início da aula são no final retomadas na atividade de avaliação, podemos concluir que estas questões, chamadas por mim de Pontos de Observação, constituem a pauta da avaliação. Ou seja, os pontos de observação constituem o planejamento da avaliação da aula.
Os pontos de observação em cada foco, apoiam a construção do aprendizado do olhar - olhar a dinâmica do encontro, dinâmica que não significa criar atividade de sensibilização, dinâmica que aqui é entendida como o jeito, o ritmo que o grupo viveu a construção das interações na aula, acelerado, arrastado, em desarmonia, em harmonia etc. Dinâmica que envolve observar o grupo juntamente com a coordenação.
Questões neste foco poderão lidar com: - Quais os movimentos rítmicos que o grupo viveu durante sua participação na aula? ou, - Como o grupo expressou suas divergências e/ou concordâncias durante a aula?
Aprendendo a olhar a si próprio, ao grupo, a dinâmica que vai sendo composta, vai alicerçando a capacidade de ler e estudar a realidade.
Observar a coordenação faz parte do pensar o que é ser educador, e o que é ser educando. É enquanto o educando observa o ensinar da coordenação, que ele aprende a ser melhor aluno e também melhor educador. Pelo simples fato de que, diante do modelo, ele pensa, reflete, distancia-se, constrói conceitos - teoria do que é aprender e ensinar.
Também observando, a coordenação inicia seu processo de desmistificação da mesma. Começa a constatar que ela comete erros, derrapadas, incoerências, etc.
Questões neste foco podem cercar:
 Como a coordenação construiu sua sintonia com o conteúdo da matéria e o significativo do grupo?
 Como a coordenação lidou com os conflitos, as divergências, as diferenças durante a aula? etc.
Estar sendo observado também é instrumento valioso para a coordenação, pois nesse retorno de seus alunos pode ter uma avaliação do que realmente está conseguindo ensinar. Se está conseguindo atingir seus objetivos ou o que falta construir de intervenções, encaminhamentos, devoluções, para a próxima aula.
Neste espaço onde o educando faz devoluções sobre seu ensinar é aonde o educador vai podendo construir-se (educando-se) também enquanto aprendiz.

SOBRE A PRÁTICA DO INSTRUMENTO DA OBSERVAÇÃO ENTRE EDUCADOR E EDUCANDO
Educador aprende a observar. Educando também.
Educando troca com educando, coordenado pelo educador, sobre o que se observa.
Educador troca com educador, coordenado por um outro educador, sobre o que se observa.
Educador interage com educando devolvendo-lhe, espelhando-lhe suas conquistas e faltas na situação observada.
O educador quando desempenha a função de observador, como co-produtor que foi da pauta e do planejamento do professor, tem urna atuação vivamente reflexiva porém silenciosa para o grupo. Silenciosa porque ele não está na função de professor do grupo. Ele é um outro educador, com uma tarefa diferenciada, específica: - observar a coordenação no seu ensinar, na sua interação com o grupo e seus participantes.
Ele não faz intervenções nem devoluções para o grupo porque não é o educador do grupo. Sua participação se dá em outro nível.
Como também, poderá haver certas atividades onde sua participação com intervenções seja planejada anteriormente.
Ele faz devoluções de suas observações para o educador do grupo. Neste sentido, um educador, quando está nesta função, é educador do educador. Por isso mesmo não interage com os educandos de seu educador, mas somente com ele (educador), devolvendo-lhe suas observações, espelhando conquistas e faltas na prática deste.

SOBRE A AÇÃO DO OBSERVADOR
Observar não é invadir o espaço do outro, sem pauta, sem planejamento, nem devolução, e muito menos sem encontro marcado...
Observar uma situação pedagógica é olhá-la, fitá-la, mirá-la, admirá-la, para ser iluminada por ela.
Observar uma situação pedagógica não é vigiá-la, mas sim, fazer vigília por ela, isto é, estar e permanecer acordado por ela, na cumplicidade da construção do projeto, na cumplicidade pedagógica.

2. O REGISTRO E A REFLEXÃO DO EDUCADOR

 Sobre o ato de escrever

"De tudo que está escrito, eu amo somente aquilo que o homem escrever com o seu próprio sangue". Nietzsche
Escrever com sangue, dor e prazer é falar do que corre em nossas veias. Falar de amor, ódio, sonho.
Ousar colocar, socializar para o outro, o que pensamos, somos, dói, "a dor é prova de existência". "A dor retrata a diferença." Não nos cabe fugir dela, e sim enfrentá-la "para a construção do prazer, do conhecimento de nós mesmos, do outro, da realidade".
Para isso é necessário conversar, dialogar com ela para que busquemos saídas, caminhos de enfrentamento no processo do conhecimento, junto com o outro. Buscar, conversar, tocar no outro, na sua ferida, faz parte da busca de comunicação.
"Minhas palavras são extensões do meu corpo, meus membros apoiam-se nelas (..) quem toca em uma das minhas palavras é como se tocasse na menina dos meus olhos (..) as palavras, podem matar", ou fazer nascer, desvelar, revelar o nascimento do outro para mim.
A marca única, genuína (sangrada) do autor emerge dessa busca de si mesmo contaminada do outro, na palavra. Dessa maneira quando escrevemos, não buscamos somente respostas únicas, mas sim essencialmente PERGUNTAMOS. Permanente inquietação de ser vivo, que nos remete a nós mesmos e à essência de nossa existência.
Por tudo isso, escrever é muito difícil. Compromete mais que falar.
Escrever deixa marca, registra pensamento, sonho, desejo de morte e vida.
Escrever dá muito trabalho porque organiza e articula o pensamento na busca de conhecer o outro, a si, o mundo.
Envolve, exige exercício disciplinado de persistência, resistência, insistência, na busca do texto verdadeiro, aquele que "o homem escreve com o seu próprio sangue ".

Reflexão e processo de formação do educador

O ato de refletir é libertador porque instrumentaliza o educador no que ele tem de mais vital: o seu pensar.
Educador algum é sujeito de sua prática se não tem apropriado a sua reflexão, o seu pensamento.
Não existe ação reflexiva que não leve sempre a constatações, descobertas, reparos, aprofundamento. E, portanto, que não nos leva a transformar algo em nós, nos outros, na realidade.
Na concepção democrática de educação, onde o ato de refletir (apropriação do pensamento) é expressão original de cada sujeito, está implícito que não existe um modelo de reflexão. Cada educador tem sua marca, o seu modo de registrar seu pensamento.
O importante é que cada um assuma este seu jeito, momento de hipótese em que se encontra dentro do seu processo.
Num primeiro momento a reflexão passa por um movimento de desintoxicação da visão autoritária que cada um viveu em relação à linguagem escrita.
A constatação é: "escrevo sem pensar"; "não consigo escrever e refletir" . É como se pensamento e linguagem escrita caminhassem dissociados. Conquista-se, nesse momento, um redimensionamento da linguagem oral e escrita, resgatando-se o próprio processo de alfabetização.
Re-descobre-se o significado do ato de escrever, não como habilidade mecânica, "escrita de letras" como diz Vygotsky, mas como comunicação de pensamento.
Dependendo da história de cada um esse movimento pode variar de intensidade e duração.
Com o exercício disciplinado da reflexão, e instrumentalizado pelo Educador, alcança-se uma fluidez desta ação generalizadora, teorizante. Fruto dessa conquista emerge a explícita necessidade de fundamentação teórica.
Pois, não existe prática sem teoria, como também não existe teoria que não tenha nascido de uma prática. Porque o importante é que a reflexão seja um instrumento dinamizador entre prática e teoria. Porém, não basta pensar, refletir, o crucial é fazer com que a reflexão nos conduza à ação transformadora, que nos comprometa com nossos desejos, nossas opções, nossa história.
Esta preocupação explícita pela fundamentação teórica é característica do segundo movimento.
Apropriando-se do que faz e pensa, o educador, sujeito pensante, começa a praticar a autoria de sua reflexão, assumindo - instrumentalizado pelo Educador - a condução do seu processo.
Bem diferente, então, daquele que no início do movimento de desintoxicação colocava fora de si a solução e as causas de seus males pedagógicos.
Bem diferente, também, daquele que se considerou formado. Estava morto e não sabia. Morto na sua criação, na sua curiosidade. Morto na sua capacidade de seduzir o outro (e se deixar seduzir) para a opção do prazer de construir, parir, seu processo de reflexão, construção de sua consciência pedagógica, política.

WEFFORT, Madalena Freire. Observação, Registro, reflexão: Instrumentos Metodológicos I. São Paulo: Espaço Pedagógico.