quinta-feira, 26 de setembro de 2013

Educação infantil onde educar e cuidar são sinônimos


Maria Helena da Silva Meller

Atualmente, no Brasil, a educação infantil faz parte da educação básica, sendo obrigatória a partir dos quatro anos de idade. No entanto, essa situação é recente.
Historicamente, tratando do assunto educação infantil, sabe-se que a mesma surge em forma assistencialista para uma camada da população, e para as mais abastadas essa instituição tratava da educação das crianças. Percebe-se nesta prática uma dicotomia. Educa-se um grupo e cuida-se de outro, para que seus pais possam produzir, ou seja, a manutenção de um país capitalista.
Vários textos acadêmicos tratam da educação infantil em seu histórico, onde as crianças eram tratadas como adultos em miniaturas. Outros tratam das teorias de aprendizagem, mostrando que crianças aprendem e como devem ser ensinadas.
Desejo fazer uma reflexão sobre quem é a criança, a percepção que se tem da mesma dentro da escola, em uma visão massificada.
É interessante perceber na semana da criança, toda a mídia dirige o seu holofote para os pequenos de toda etnia, de todo tamanho, baixinhas, gordinhas, ricas, pobres, todas são crianças.
Visitando escolas de atendimento a educação infantil, por mais que a legislação em vigor exija formação dos docentes, os mesmos, ainda, estão descortinando a metodologia para desenvolver um trabalho pedagógico que respeite a criança no que ela é, um ser em desenvolvimento geral.
Neste momento de sua vida, a criança enquanto ser que é, está desenvolvendo a comunicação, linguagem compreensiva e expressiva, o crescimento físico, a coordenação motora ampla fina, os conceitos. Descobrindo a si mesma, o outro e o mundo. Portanto, o trabalho desenvolvido com esse grupo deve ser muito relevante, aprimorado, cuidadoso.
Não deve ser um processo escolarizado, preparação para algo. Pois a criança É o que É naquele momento.
Se a sociedade, em sua organização complexa, necessita de, no futuro, ter adultos saudáveis: emocional, física e cognitivamente deve promover na atualidade para as crianças um espaço onde essas se sintam seguras e sejam desafiadas constantemente de forma tranquila. Desafios físicos, cognitivos, um local com disciplina, normas com nível de compreensão de cada faixa etária. Cada sujeito deve ser percebido em sua individualidade, suas características pessoais.
A educação escolar, na educação infantil, não deve simplesmente alojar crianças em um espaço em que as mesmas não se machuquem e deixar muitos brinquedos à disposição, alimentando-as nas horas certas. Esse cuidado também se tem com os animais em qualquer pet shop.
Cuidar de um Ser significa estar presente, perceber esse ser em suas necessidades em suas múltiplas faces. Observá-la, não como quem vigia e sim como quem acompanha.
Toda a legislação brasileira em vigor, com relação à criança, justificaria uma política voltada para uma educação comprometida com esse Ser em desenvolvimento. Partindo da formação docente, boas condições de trabalho, bem como bons salários e orientações. Ainda, prédios com mobílias e utensílios adaptados ao tamanho desses estudantes.
Educar e cuidar na concepção atual deixa para trás a dicotomia de classes sociais, a padronização, a homogeneização, a massificação, em que todas as crianças devem falar, caminhar ao mesmo tempo cronológico, desconsiderando as características individuais de ordem: física, motora,  emocionais, a segurança, os desafios.
Qual a expectativa dos pais com relação à criança? E a expectativa dos docentes? São positivas, de possibilidades? Esses docentes tem uma percepção da criança como criança, ou na escola essa passa a ser apenas um objeto de trabalho? Onde o docente deve planejar suas aulas, descrever a rotina, o que acontecerá naquele dia de trabalho. Por que muitos docentes de creches públicas mantem seus filhos em “escolinhas” particulares? Ou, essas, como mães são bastante atentas com as colegas que são professoras de seus filhos, no entanto com os rebentos da classe popular, basta que ponham os pequenos no parque e fiquem observando de que forma brincam. As alternativas são poucas para essa classe social.
Educar e cuidar em uma concepção mais humana não acontece por decreto. Incide quando cada adulto envolvido com a educação, ou seja, toda a sociedade perceber a criança como um ser que aprende, um ser que se comunica, que é sensível às mensagens verbais e extravertais, aos acontecimentos.
Educar deixa marcas, quais marcas estamos deixando em nossas crianças da educação infantil? De otimismo, de avanços, de amor, de cuidados. Pois o que ela aprender, ela aplicará.
Estamos preparados para receber como retorno tudo o que foi ensinado às nossas crianças? Saberão cuidar da sociedade? Que sociedade queremos?
Vamos permitir que nossos pequenos brinquem, corram, cantem, errem, sejam desafiados.. Fazendo as intervenções necessárias com cuidado.  Consentir que perguntem e argumentem, cuidando para que desenvolvam com segurança, autonomia e amor a si, aos outros e à natureza. Para que, de fato, tenhamos uma sociedade prescrita em quase todas as propostas pedagógicas: uma sociedade justa e humana.


sexta-feira, 20 de setembro de 2013

Gestão Democrática e Planejamento Estratégico: Indícios De Possibilidades


Maria Helena da Silva Meller



Na área da educação, quando se menciona o termo estratégia, pelos estudos frequentes, em uma concepção critico social, logo vem ao pensamento o modelo de educação tecnicista. Como se somente o mesmo pudesse utilizá-lo.
Em pleno século XXI, todos os documentos legais e teóricos tratam da gestão em uma concepção democrática de educação, há um recorro pelo fazer coletivo, mesmo que no discurso. Assim, toda forma de pensar a escola deve perpassar por todos os atores. Pais, docentes, direção, estudantes e comunidade participam da elaboração da proposta pedagógica (LDB).
Pensar o fazer pedagógico da escola significa conhecê-la em seus múltiplos aspectos, históricos, culturais, ainda, a própria instituição, sua cotidianidade, sua prática, seu entorno comunitário. Também seu desenvolvimento, suas fortalezas e suas fragilidades nos seus campos: pedagógicos, administrativos e comunitários, no dizer de autores como Gandin e Vasconcelos.
Posto isso, percebe-se que esse não é um trabalho estanque e de curto prazo, pois as pessoas precisam ser ouvidas. Há que se organizar as questões. Se pensar na instituição, como essa se apresenta e a que distância se está do ideal, do desejado, da escola que provê as necessidades detectadas pelo coletivo. Indicar: o que é possível propor a curto, médio e longo prazos.
É possível aferir que este planejamento, estudo da realidade, demanda uma coordenação que conheça sobre planejamento e gestão. Que elabore um roteiro, um cronograma e indique funções adequadas a cada membro da equipe.
A escola está vinculada a vários segmentos, por mais autonomia que tenha, essa não acontece em todos os aspectos, principalmente em se tratando de instituição pública. Portanto, assumir uma gestão democrática implica em uma série de observações. Em se tratando de planejamento, nessa perspectiva, o instrumento/documento planejamento não tem grandes alterações e nem a denominação tem grande relevância. Embora, as palavras estejam cheia de ideologias.
Ratificando, parte-se das necessidades percebidas pelo coletivo da Unidade, coordenada de forma disciplinada e flexível, respeitando os tempos de compreensão dos envolvidos. O estudo da realidade deve ser o tempo todo registrado por atas, fotos...
A partir do documento elaborado, denominado proposta pedagógica, em consonância com todos os documentos legais, em nível do seu Sistema, cabe a cada profissional da instituição elaborar o planejamento de suas atribuições, gestor, especialistas e docentes. Ou seja, o docente, o planejamento de ensino, os especialistas, seu planejamento de suas funções e o gestor o planejamento estratégico para que as linhas de ações possam se transformar em ações concretas (no dizer de Vasconcelos) e não simplesmente que as ações aconteçam aleatoriamente ou quando exigido por autoridade competente.
O gestor deve ter muito claro quais documentos se constituem em leis e quais devem ser seguidas. Ampliando, por exemplo, para uma Rede: Proposta Curricular, sem a mesma cada U.E. pode desenvolver o trabalho pedagógico como deseja. Por sua vez a Proposta Pedagógica com os indicadores políticos, filosóficos, pedagógicos, de avaliação, metodológicos, para que haja um trabalho coeso, articulado e sistematizado. Sem tais documentos, quer uma Rede ou uma Unidade escolar, não conseguem desenvolver um trabalho pedagógico capaz de promover um ensino de qualidade proposto pelas leis em vigor.
Diante do exposto, cabe ao gestor da instituição elaborar o seu planejamento estratégico, verificando na Proposta Pedagógica o que cabe à equipe gestora:
O QUE FAZER?
COMO FAZER?
PRAZO
RESPONSÁVEL
Objetivos
Estratégias – utilizando o gerúndio (exemplo elaborando, propondo...)
Mês e ano
Nome da pessoa indicada que não necessita ser o diretor

Lembrando que, quando se chega a este quadro, houve todo um processo de discussão pautado em linhas filosóficas, pedagógicas, legislação. Onde todos tiveram participação, estudantes, pais, docentes e equipe diretiva. É um processo que pode levar em torno de oito meses a um ano.
Conclui-se afirmando sobre as possibilidades de elaboração de um planejamento estratégico, disciplinado partindo das discussões do coletivo, participativo, com metas, objetivos, prazos designados. É possível, projetar, estudar e propor, avaliar constantemente os resultados. Isso não significa que todas as ações serão concretizadas, porque a escola é uma sociedade, um conjunto de elementos. Nesse contexto existe um processo intenso entre pessoas, práticas e teorias e não há como determinar, padronizar, seria um paradoxo em uma visão dialética de educação.



Leituras indicadas:

BRASIL, Lei n. 9394/1996. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
GANDIN. Danilo. A prática do planejamento participativo. Petrópolis. Vozes.
VASCONCELOS, Celso. Planejamento: Plano de Ensino-Aprendizagem e Projeto Educativo. Libertad.




domingo, 1 de setembro de 2013

Gestão democrática no Brasil: é chegado o momento?



Maria Helena da Silva Meller 


Administrar, gerir, mandar, relação de poder, estar no poder, manter status. Muitas são as designações, bem como as concepções para liderar um grupo. Ser um gestor, gerente, coordenador, alguém que tenha subordinados, esse é o sonho de muitos profissionais.
A educação escolar em seu histórico, sempre se manteve dentro do contexto social como toda e qualquer instituição. Portanto, sendo e tendo os mesmos valores e hábitos, no caso reproduzindo a sociedade.
Em um sistema capitalista, cujas relações são estabelecidas, com base nas questões financeiras e no parecer ser, ser diretor de uma escola era um projeto de muitos docentes. Ainda o é. Destarte, apesar de determinados valores não serem baixados por decreto, a Constituição Federal traz avanços, dentre eles incutir uma visão de democracia, de fato.
Partindo dessa premissa, indo ao encontro de muitos cidadãos que, de fato, acreditam nesta possibilidade, começam os questionamentos dentro da escola: como é possível uma gestão democrática quando o diretor é indicado por partidos políticos? Como vivenciar a gestão democrática, se muitos têm medo de se expor? De tirar o tirar o lixo “de debaixo do tapete”, de fazer uma incursão na história e reconhecer a instalação da cultura organizacional atual? Quem são os lideres da instituição? Os seguidores? Como foram “imponderados”?
Essas questões não podem ser desconsideradas, ignoradas, pois elas existem, mesmo que não sejam explicitadas por seus atores.
Há que se abrir espaço para a compreensão da realidade, quais as possibilidades, em que medida no contexto atual, se pode ir construindo uma gestão democrática. Quais as limitações? Em que grau tais limites podem e devem ser transformados em questões concretas, problematizando e não polemizando. Transformando problemas em necessidades, essas em metas, e em ações. Quais são passíveis de alterações imediatas, e a curto, médio e longo prazo? Ações podem ser modificadas, e os valores, hábitos, pautados em uma visão democrática, não podem vir por decreto. Portanto, o processo precisa ser respeitado.
Em outro extremo, a democracia surge quando o homem abdicou e seu direito individual, para que alguém da comunidade pudesse representa-lo, ou seja, continua um sujeito de direitos, no entanto não mais um amontoado de pessoas, mas um coletivo com representação. Sendo este representante, em principio, fiel ao seu grupo, àqueles que o escolheram. Assim, com autoridade, presume-se com o conhecimento necessário para que, diante de cada conflito não venha chamar cada sujeito e perguntar o que fazer e, sim, tomar as atitudes necessárias, balizadas em um conjunto de princípios, a priori, acordados entre o grupo. Um código, regras, normas constituídas pelo grupo ao longo de sua história. Neste caso, a democracia não consegue suprir o desejo de cada indivíduo, porém do coletivo, da maioria.
Voltando ao interior da escola brasileira, com seu histórico político, econômico e social, vivenciar a democracia pode ter muitas conotações.
Cabe aqui indicar que a questão ultrapassa a letra da Lei, bem como as terminologias utilizadas no que tange à “gestão democrática”.
Farei um viés diferenciado neste texto, tratando da questão de liderança e de seres humanos. Isso não está dissociado e, muito menos, alienado das questões políticas, porquanto há um posicionamento. Uma visão de homem, de mundo e de contexto.
Quando um cidadão, por quaisquer circunstâncias, assumiu a direção de uma instituição escolar, pode ter a visão de coletivo, não de aglomerado de pessoas, mas de grupo. Nesta perspectiva, utiliza-se da empatia e se percebe com e no grupo, ainda, reconhece as ações, falas de seus pares como decorrentes de histórias, pois comunicam muito mais do que dizem. Quando esse diretor de escola é mais que um cargo, uma função, e sim uma atribuição social em prol de outros cidadãos no interior da unidade e fora da instituição, seu trabalho tem uma conotação diferenciada daquela de cumprir tarefas.
Com esse texto não pretendo afirmar que seja uma tarefa fácil, mas não complexa, pois perceber as demais pessoas como sujeitos, portanto seres humanos, com todas as suas características faz parte do cotidiano, pois somos seres sociais, portanto gregários.
Essa perspectiva de escola democrática vem ao encontro dos conceitos educar e cuidar. À escola foi outorgado o dever de educar, portanto não são somente conteúdos científicos que perpassam pela instituição. Todos os modelos, os exemplos, as diferentes personalidades com quem os estudantes convivem educam. Significa dizer que repassam para o grupo uma série de valores, costumes, reforçam hábitos, quer sejam positivos ou negativos, pois é um campo amplo e complexo, não há como limitar a expressão humana. Assim como o cuidar, está no discurso e projetos pedagógicos de quase todas as escolas, pois está previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais. Não se cuida por decreto, se cuida por perceber o outro como semelhante, por haver identificação. Cuida-se porque é humano cuidar um do outro, ratificando não somos seres segregados, como os demais animais aprendemos a viver em grupo. Cuidar do outro é perceber-se como gente, mais que um técnico que recebe para cumprir tarefa.
Administrar uma escola, em um amplo contexto cultual e político, que começa a perceber as possibilidades da democracia, dependerá, também, do perfil do gestor, de suas características pessoais, de sua concepção de homem e de mundo. Sua percepção do presente e esperança no futuro.