domingo, 1 de setembro de 2013

Gestão democrática no Brasil: é chegado o momento?



Maria Helena da Silva Meller 


Administrar, gerir, mandar, relação de poder, estar no poder, manter status. Muitas são as designações, bem como as concepções para liderar um grupo. Ser um gestor, gerente, coordenador, alguém que tenha subordinados, esse é o sonho de muitos profissionais.
A educação escolar em seu histórico, sempre se manteve dentro do contexto social como toda e qualquer instituição. Portanto, sendo e tendo os mesmos valores e hábitos, no caso reproduzindo a sociedade.
Em um sistema capitalista, cujas relações são estabelecidas, com base nas questões financeiras e no parecer ser, ser diretor de uma escola era um projeto de muitos docentes. Ainda o é. Destarte, apesar de determinados valores não serem baixados por decreto, a Constituição Federal traz avanços, dentre eles incutir uma visão de democracia, de fato.
Partindo dessa premissa, indo ao encontro de muitos cidadãos que, de fato, acreditam nesta possibilidade, começam os questionamentos dentro da escola: como é possível uma gestão democrática quando o diretor é indicado por partidos políticos? Como vivenciar a gestão democrática, se muitos têm medo de se expor? De tirar o tirar o lixo “de debaixo do tapete”, de fazer uma incursão na história e reconhecer a instalação da cultura organizacional atual? Quem são os lideres da instituição? Os seguidores? Como foram “imponderados”?
Essas questões não podem ser desconsideradas, ignoradas, pois elas existem, mesmo que não sejam explicitadas por seus atores.
Há que se abrir espaço para a compreensão da realidade, quais as possibilidades, em que medida no contexto atual, se pode ir construindo uma gestão democrática. Quais as limitações? Em que grau tais limites podem e devem ser transformados em questões concretas, problematizando e não polemizando. Transformando problemas em necessidades, essas em metas, e em ações. Quais são passíveis de alterações imediatas, e a curto, médio e longo prazo? Ações podem ser modificadas, e os valores, hábitos, pautados em uma visão democrática, não podem vir por decreto. Portanto, o processo precisa ser respeitado.
Em outro extremo, a democracia surge quando o homem abdicou e seu direito individual, para que alguém da comunidade pudesse representa-lo, ou seja, continua um sujeito de direitos, no entanto não mais um amontoado de pessoas, mas um coletivo com representação. Sendo este representante, em principio, fiel ao seu grupo, àqueles que o escolheram. Assim, com autoridade, presume-se com o conhecimento necessário para que, diante de cada conflito não venha chamar cada sujeito e perguntar o que fazer e, sim, tomar as atitudes necessárias, balizadas em um conjunto de princípios, a priori, acordados entre o grupo. Um código, regras, normas constituídas pelo grupo ao longo de sua história. Neste caso, a democracia não consegue suprir o desejo de cada indivíduo, porém do coletivo, da maioria.
Voltando ao interior da escola brasileira, com seu histórico político, econômico e social, vivenciar a democracia pode ter muitas conotações.
Cabe aqui indicar que a questão ultrapassa a letra da Lei, bem como as terminologias utilizadas no que tange à “gestão democrática”.
Farei um viés diferenciado neste texto, tratando da questão de liderança e de seres humanos. Isso não está dissociado e, muito menos, alienado das questões políticas, porquanto há um posicionamento. Uma visão de homem, de mundo e de contexto.
Quando um cidadão, por quaisquer circunstâncias, assumiu a direção de uma instituição escolar, pode ter a visão de coletivo, não de aglomerado de pessoas, mas de grupo. Nesta perspectiva, utiliza-se da empatia e se percebe com e no grupo, ainda, reconhece as ações, falas de seus pares como decorrentes de histórias, pois comunicam muito mais do que dizem. Quando esse diretor de escola é mais que um cargo, uma função, e sim uma atribuição social em prol de outros cidadãos no interior da unidade e fora da instituição, seu trabalho tem uma conotação diferenciada daquela de cumprir tarefas.
Com esse texto não pretendo afirmar que seja uma tarefa fácil, mas não complexa, pois perceber as demais pessoas como sujeitos, portanto seres humanos, com todas as suas características faz parte do cotidiano, pois somos seres sociais, portanto gregários.
Essa perspectiva de escola democrática vem ao encontro dos conceitos educar e cuidar. À escola foi outorgado o dever de educar, portanto não são somente conteúdos científicos que perpassam pela instituição. Todos os modelos, os exemplos, as diferentes personalidades com quem os estudantes convivem educam. Significa dizer que repassam para o grupo uma série de valores, costumes, reforçam hábitos, quer sejam positivos ou negativos, pois é um campo amplo e complexo, não há como limitar a expressão humana. Assim como o cuidar, está no discurso e projetos pedagógicos de quase todas as escolas, pois está previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais. Não se cuida por decreto, se cuida por perceber o outro como semelhante, por haver identificação. Cuida-se porque é humano cuidar um do outro, ratificando não somos seres segregados, como os demais animais aprendemos a viver em grupo. Cuidar do outro é perceber-se como gente, mais que um técnico que recebe para cumprir tarefa.
Administrar uma escola, em um amplo contexto cultual e político, que começa a perceber as possibilidades da democracia, dependerá, também, do perfil do gestor, de suas características pessoais, de sua concepção de homem e de mundo. Sua percepção do presente e esperança no futuro.