sexta-feira, 23 de julho de 2021

(Des)estrutura emocional: ressignificando paradígmas

 

Maria Helena 

(elaborado a partir da palestraSaúde Mental: Um Olhar Ao Sofrimento Psíquico Em Um Mundo Pós-Pandemia André Figueira)

             A pandemia decorrente do corona vírus vem provocando uma grande revisão em todos os padrões estabelecidos na e pela sociedade. Pois, sendo o homem um ser social, ao longo de sua história foi criando regras para uma boa convivência e nestas combinações, uma geração passando à outra toda a sua cultura. Aqui a definição acaba por coincidir com a educação em sentido geral, quando Brandão (2002) afirma ser essa um conjunto de conhecimentos, crenças, valores de que um grupo comunga e repassa aos mais jovens por meio de sua prática cotidiana.

O contexto oferecido pela pandemia é em principio assustadora em todos os aspectos: midiático, pela própria ciência não fornecer certezas das causas e consequências da saúde individual e coletiva. O fenômeno fez a economia recolher-se aguardando momentos mais certos. Contudo, certeza indicada por quais indicadores?. Nunca se ouviu falar tanto em observatórios. Assim como: lockdawn, homeoffice, remoto. O uso do álcool em gel substituiu o sabonete, modelos de máscaras ditando moda.

Um novo paradigma se instalou, entendo-o como padrão, modelo. Trazendo à tona, para Lemos (2019) o conceito de Kuhn, o paradigma assume uma função estruturante da maneira de analisar e compreender os fenômenos, enquanto para Morin, se percebe como a matriz do pensamento ocidental indica um significado amplo.

Ante ao exposto, perante o cenário o qual estamos vivenciando, todos estamos experimentando situações cotidianas, tentando refazer uma rotina. Cada ciência lança sobre o mesmo o seu olhar, descrevendo as características a partir de sua posição política e filosófica.

Fazendo uma incursão na história se percebe momentos aos quais a humanidade teve que se adaptar rapidamente às novas condições impostas: guerras, peste negra, gripe espanhola, intempéries. Ainda, com relação às questões da economia, da agricultura manual às máquinas, do serviço artesanal à manufatura, à revolução industrial. Situações essas geraram novas condições à sociedade, ocasionando incerteza, insegurança. Se vivia no improviso, sim, pois um novo paradigma não permite tempo para planejar-se, provisório, não se teve e nem se tem agora a certeza de prazos. Toda a rotina é alterada, e nunca a tecnologia esteve tão presente em nossas vidas. Mesmo o homem sendo um ser social, se vê limitado por poder ter suas relações interpessoais mediada por aparelhos, celulares, computadores. É uma realidade posta e imposta.

A situação descrita vem causando um estresse, pois diante de qualquer nova situação o organismo reage de várias formas, quer emocional ou fisicamente.

No contexto atual, cada sujeito se esbarra com a sua própria estrutura, conhecê-la para ir adiante, ou ir adiante para se conhecer ou ressignificar a sua estrutura, principalmente a emocional. Cada ser é formado a partir de emoções, conhecimentos, valores de seu entorno. Assim, há percepção coletiva, contudo, há uma percepção individual.

Na percepção coletiva aproveito o conceito de Representação Social de Serge Moscovici. Talvez pareça paradoxo, no entanto deseja-se trazer o grupo nesta visão de mundo.

De acordo com Portal Educação (2020) Serge Moscovici se ocupou do estudo da difusão da psicanálise, de sua apropriação e transformação pela mesma para outras funções sociais. Poderia se estar tratando da sociologia de Durkheim, porém seu olhar para o grupo se distanciava dessa visão. Tornando-se, assim o núcleo de uma investida, não mais como um amontoado de sujeitos social de forma excessivamente individualista.

Diante do cenário a nós apresentado pela pandemia, entende-se fundamental a compreensão do que seja uma representação social. Seguindo a autoria supracitada, este conceito está para além de mera opinião, relaciona-se está à avaliação do objeto, aos sentimentos, à pertença de um grupo, respeitadas as categorias individuais destes agrupamentos, quer social, econômico.

Se comparada às situações vivenciadas pela humanidade nos séculos passados, com um modelo de ciência, onde os paradigmas eram rígidos, sem uma visão dialética de cada momento, esta pandemia pautada em um modelo de ciência contemporâneo, traz um olhar multifocal para o fenômeno.

Ratifica-se o posicionamento do Portal Educação (2020) quando salienta Moscovici, que atualmente existem os pensamentos considerados reificados que são os saberes considerados com a rigorosidade cientifica, temos ainda, as especialidades. E os pensamentos consensuais em que não existe a exigência de métodos comprovados, a legitimação do conhecimento acontece pela atividade intelectual partilhada com o grupo no cotidiano.

Diante ao exposto trago a palestra de André Figueira neste Congresso, onde há um esclarecimento necessário ao sujeito e ao grupo, sem a exclusão mútua. Pois uma sociedade e feita de sujeitos, não sendo saudável massificá-la ou patologizá-la, em qualquer situação. Pois cada indivíduo fará os enfrentamentos do seu jeito.

Para Figueira (2020) a negação também é um modo de encarar a realidade. Mesmo as piadas são formas de lidar com os problemas decorrentes da pandemia. Outros ficam ligados a todos os dados, se informando exaustivamente. Alguns acreditam de tal modo onde há um isolamento quase patológico. Porém, são mecanismos que cada sujeito consegue reagir. Cada qual sofre e não percebe o próprio sofrimento, sublimando, por vezes: estudando, praticando esportes, aprendendo cozinhar, cuidar de plantas, entre outros.

Assim, o paradigma que está instalado, pois temos uma sociedade posta, está propondo que cada sujeito se descubra para conseguir fazer a travessia.

Figueira (2020) assevera que este tempo o qual estamos vivendo é um momento propicio para reconhecer o sofrimento, os próprios afetos, compreendendo a maneira como somos atingidos. A maneira como cada sujeito se dispõe a observar e acolher a forma como é afetado por essa avalanche provocada pela pandemia, também é muito importante. O escapar o controle sobre o futuro apresenta implicações bastante diversas entre sujeitos.

O autor continua sua reflexão afirmando que o não saber o que irá acontecer é desorganizante, é uma grande oportunidade de defrontação de ser, sofrer no mundo e vem acompanhado de angústia. Claro está que este novo paradigma deve ser observado com mais cautela.

 E isso não é uma tarefa fácil, segundo Figueira (2020), pois essa experiência com o mundo, relacionar-se com este novo cenário gera sofrimento. Contudo, há pistas de como estabelecer uma relação com a realidade posta, exemplo: tentar criar uma rotina, ou preservar aquela que havia, no que for possível, para que possa encontrar algo familiar neste regime tão rígido. Mesmo que sejam pequenas questões, situações, limitar tempo para cada tarefa, estando em homeoffice e não fazer de toda a casa um escritório, alimentar-se nos horários devidos.

Estamos fazendo uma travessia desgastante, devido ao número de doentes, de luto, desemprego, porém, devemos aprender a conhecer o mundo como vem se apresentando.

Diante da exposição de Figueira (2020) a reflexão segue sobre o momento atual, este necessita de acolhimento, de escuta acolhedora, empatia. Sem viver de frases prontas, porém não proporcionar ainda mais a desestrutura de quem busca se autoconhecer, pois cada sujeito lida com sua realidade de acordo com a sua bagagem, com o que construiu até então.

Por vezes passa a sensação de estarmos anestesiados diante de tanta informação, tantas notícias tristes, desanimadoras, sem o devido tempo para refletir sobre como estão as pessoas em suas casas, em seus trabalhos, nas possibilidades de lazer, passado um ano da pandemia. Em contrapartida, percebo o empenho de muitos, porém, é preciso olhar para além da cortina de fumaça que nos engana, turva a percepção do objeto a ser observado, neste caso nossa estrutura emocional.

A partir da palestra e dialogando com demais autores é possível pensar, de modo bastante efêmero, ainda, que durante uma tempestade, somos bastante extremistas, ou temos muitas certezas ou não sabemos no que acreditar. A realidade posta ou imposta nos faz muitas perguntas e exige respostas rápidas, porém momentâneas.

 

Referências bibliográficas:

 BRANDÃO, Carlos R. O que é educação. São Paulo: Editora Brasiliense, 2002. 

LEMOS, P. B. Silva. O conceito de paradigma em Thomas Kunh e Edgar Morin: similitudes e diferenças. Publicado em 27/06/2019. Disponível em:<  (PDF) O conceito de paradigma em Thomas Kunh e Edgar Morin: similitudes e diferenças (researchgate.net)>. Acesso: 16/06/2021.

FIGUEIRA, André. Saúde Mental: Um Olhar Ao Sofrimento Psíquico Em Um Mundo Pós-Pandemia. Congresso Brasileiro de Inovação. Disponível em: < Saúde Mental: Um Olhar Ao Sofrimento Psíquico - Palestra de André Figueira - Inovação PRO [Unimind] (inovacao.pro)>

PORTAL EDUCAÇÃO. Teoria das representações sociais. Disponível em: <teoria das representações sociais - portal educação (portaleducacao.com.br)>. Acesso: 17/06/2021.