quinta-feira, 20 de abril de 2023

A Personalidade em sua síntese: Saúde Ou Norma?

 The Personality in its synthesis: Health or Norm?

Maria Helena 

                               “Só a experiência própria é capaz de tornar sábio o ser humano”. (Freud)

 Com o curso de Psicanálise venho aprofundando algumas constatações que, até então, eram algumas percepções as quais considero superficiais.

O fio condutor, didaticamente elaborado do fazer psicanalítico, transcende em ver o ser que sofre, para além de uma justaposição de mente, corpo e cultura.

Partindo das pesquisas de Freud ou Lacan, ainda, dos demais autores de que tratam do referido tema, verificado a voz daquele que sofre, ser conduzido pelos sintomas, até chegar em uma verdade, não é possível existir um ser humano sem nenhuma frustração.

Mesmo existindo diferentes personalidades, existem diferentes desejos em cada uma. E como a vida é movimento, há transformações, portanto, impossível não haver oscilação na tentativa de se integrar, adaptar ao novo. E quanto mais novo, mais a psique deve gerar energia a fim de buscar um equilíbrio, portanto mais sinapses, mais adrenalina e outros hormônios, mais emoções e sentimentos em um só foco. Tudo isso forjando uma personalidade.

As denominações de personalidades têm sua história com o próprio desenvolvimentos da medicina, psicologia e psicanálise, em um contexto cultural. Para falar de um transtorno, deve-se conhecer o padrão, referência usada como saudável, aqui no caso, a personalidade.

Para Dalgalarrondo (2008) o tema personalidade é complexo, portanto, também fonte de muitos erros.

 O presente artigo é parte complementar do curso Personalidade e Psicopatologias (IBPC) e objetiva analisar a procura pela “normalização” de um paciente em busca da psicanálise.

É uma reflexão pautada na visão quantiqualitativa, trazendo pesquisadores que fizeram deste tema sua busca constante.

1.1    Tipos e Transtornos de personalidades:

 Dalgalarrondo (2008) indica que a primeira tipologia foi da medicina hipocrática e é essencialmente ambientalista, ou seja, focada nos elementos: água, ventos, solo, umidade do ar, entre outros, interagindo com o corpo humano. Sendo os humores com os respectivos órgãos: o sangue é o coração; a bílis é o fígado; o fleuma é o cérebro e a atrabilis é o baço.

Jung, por sua vez, faz uma organização dos aspectos de personalidade: a extroversão, a libido flui em direção aos objetos externos; e a introversão a libido recua ao mundo interior.

Para Freud a constituição da personalidade passa pelo desenvolvimento das fases da libido, como se estrutura o desejo inconsciente. Assim temos: neurose, psicose e perversão.

Para a psicanálise as fixações infantis da libido e a tendência à regressão determinam os diferentes tipos de neurose e o perfil de personalidade do adulto. (DALGALARRONDO, 2008)

As neurociências demonstram como as emoções se desenvolveram para aumentar a sobrevivência e garantir a existência da espécie. (Zimermann, 2008).

O DSM-5 (2013) divide os 10 tipos de transtornos de personalidade em 3 grupos com base em características semelhantes. O grupo A é caracterizado por parecer estranho ou excêntrico. São os seguintes transtornos: Paranoide: desconfiança e suspeita; Esquizoide: desinteresse em outras pessoas; Esquizotípico: ideias e comportamentos excêntricos. Grupo B: Antissocial: irresponsabilidade social, desrespeito por outros, falsidade e manipulação dos outros para ganho pessoal; Borderline: vazio interior, relacionamentos instáveis e desregulação emocional; Histriônico: busca de atenção e emocionalidade excessiva; Narcisístico: autograndiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia. Grupo C:  Esquivo: evitar contato interpessoal por causa de sensibilidade à rejeição; Dependente: submissão e necessidade de ser cuidado; Obsessivo-compulsivo: perfeccionismo, rigidez, e obstinação.

       1.2    O ser humano de cada um

“Conheceis a verdade e ela vos libertará” (João 8, 32). “Conhece-te a ti mesmo”. (Sócrates 470 a.C.). Assim, quer por uma visão espiritualizada ou filosófica, é bastante não diria antiga, diria fortalecida a importância em buscar em si, as próprias estruturas, os próprios princípios, aquilo que é a alma do sujeito, o seu próprio ser.

Muitos afetos inconscientes vazam em forma de sofrimentos físicos. Sem um diagnóstico que seja comprovado por exames de imagem ou laboratoriais.

 O somatizador tem dificuldades de fantasiar, de sorte que o ego não consegue processar, elaborar e representar as pulsões, do que resulta que ele superlibidinizar o corpo de forma concreta. (Zimerman, 2008).

Um ser é mais que a junção do físico, emocional, intelectual e espiritual. Síntese é um substantivo feminino, parte do método dialético, tese, antítese e síntese. Processo ou operação que consiste em reunir elementos diferentes, concretos ou abstratos, e fundi-los em um todo coerente.

Para McWilliams (2014) “é a percepção de padrões oscilantes que enriquece as noções analíticas de caráter e as torna mais genuinamente clínicas do que uma lista de atributos estáticos. ” (p.60)

Diante ao exposto, a psicanálise, enquanto método e didática faz suas classificações, no entanto é para analisar um Ser.

O analista deve ajudá-los a que os expressem para os outros, logo, para o analista na situação analítica, porquanto isto desempenha um importante papel na – fundamental – função de regulação da atividade emociona. (Zimerman, 2008)

Aquele que busca a psicanálise necessitando minimizar o seu sofrimento, em princípio, enfrentará as suas resistências, no sentido de reconhecê-las. Perceberá o que é parte de sua personalidade, terá uma melhor compreensão de seus desejos ocultos, os quais não podem ser concretizados, muitas vezes, devido ao seu severo superego. Portanto, o grande conflito id-superego.

Mais que um profundo reconhecimento daquilo que é externo, o seu entorno social, cultura, a aceitação dos demais sobre a sua conduta, cabe àquele que sofre não se perceber normal, e sim saudável. Sentir-se em paz, sem angustias, medos, sintomas psicossomáticos de toda ordem.

Conclusão:

São diferentes seres, com diferentes genéticas, temperamentos, vida afetiva se foram amados, negligenciados, alimentos para o físico e para alma. Tudo isso implicará em sua personalidade.

 Aquilo que poderia ser considerado um transtorno, pode fazer parte do seu Eu, considerado pelo analisando como saudável. Em contrapartida, aquilo que ele traz como a queixa inicial pode esconder algo que está muito longe para que acesse ao afeto, sozinho.

Referências bibliográficas:

Dalgalarrondo, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008.

DSM-5Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2014.

McWilliams, Nancy. Diagnóstico Psicanalítico. Porto Alegre: Artmed, 2014.

Zimermann, David E. Manual de Técnica Psicanalítica. Artmed, 2008.

 

 

 

 

 

 

Sonhos: para transpor a porta é preciso conhecer a cena

                 Dreams: to go through the door you need to know the scene

     Maria Helena

            No módulo 08 do curso de Psicanálise Clínica (IBPC), cujo tema é Sonhos, Simbologias e Representações, percebe-se a importância de interpretar os sonhos para auxiliar o analisando a organizar e compreender os seus sentimentos. Contudo, há uma importância fundamental neste item, o de reconhecer o contexto do sujeito para não se utilizar de símbolos, ou melhor de objetos que, para determinado grupo, não simbolize nada.

Representar significa ser a imagem, o símbolo, a reprodução de; exibir em teatro; levar à cena, encenar; interpretar (um personagem) em teatro, cinema, televisão etc.; desempenhar (papel) como ator; atuar.(Bing, 2021)

Conforme o referencial teórico trazido pelo método de representação dos sonhos, o ato de interpretar, representar não é difícil, porém é complexo, pois é necessário conhecer um conjunto de elementos.

Simbologia significa a arte de criar símbolos, o estudo ou interpretação dos símbolos, sistema de símbolos.(Bing, 2021) Aqui nos vem uma observação, somente é possível para aqueles que compreendem tal sinal, terá significado se conhecerem o significante.

A experiência subjetiva que aparece na consciência denominado sonho é o resultado final de uma atividade mental inconsciente. O sonho manifesto é a experiência consciente, durante o sono, que a pessoa pode ou não recordar depois de despertar. Os pensamentos e desejos inconscientes que ameaçam acordar a pessoa são denominados conteúdo latente do sonho. (IBPC, 2020).

Se comprovadamente os sonhos conseguem oferecer uma ferramenta poderosa para adentrar ao inconsciente de um sujeito, é imprescindível ao analista conhecer muito de semiologia, para entender signos, ícones, símbolos, significante, significado, diversidade cultural. Caso contrário, utilizará como um manual, um “CID”. Mais desafiador ainda, porque o analisando irá narrar o sonho da forma como lembra, talvez, faça recortes no intuído de não se “machucar”. Portanto o interlocutor deverá ser um exímio observador, estar focado literalmente no que é comunicado, para poder auxiliar o analisando a interpretar, a partir de princípios técnicos, todos os mecanismos que fazem parte desta importante ferramenta.

Sendo o sonho um recurso importante, o analista deve estar atento quando pode ocorrer a narrativa, pois pode acontecer no primeiro dia, na primeira consulta quando o psicanalista estará fazendo a entrevista para o diagnóstico, por exemplo. Assim, o profissional deve possuir bastante, “treino”, experiência, desenvoltura para não perder detalhes da entrevista que possa vir através de um sonho.

Para Dalgalarrondo (2008, p. 57) [...] “na própria formulação sobre o que seriam os fatos reais ou concretos, intervêm a linguagem e uma certa interpretação prévia desses fatos". Significa dizer que a linha filosófica que o analista segue, irá interferir na abstração realizada do sonho do analisando.

Segue o supracitado autor: “fatos brutos, originais intocados pelas representações e teorias que deles são feitas, são, na verdade, mais virtuais que reais.” (p. 57, 2008). Diante disso, a coerência, o produzir resultados eficientes, usar de ética, não é tão simples assim. Pois o analisando tem o direito de todas as incoerências simulando ou dissimulando, porém, o profissional, não.

Outros dois conceitos são fundamentais para seguimos o texto e o contexto: consciência e inconsciência. Porque de acordo com Dalgalarrondo (2008), pode existir o sentido de consciência, enquanto estado de vigília, que seria a neuropsicológica. Em uma definição psicológica, por sua vez, é a dimensão subjetiva da atividade psíquica do sujeito. E a definição ético filosófica refere-se à ciência dos direitos, deveres e responsabilidades com ética. E a inconsciência, é um conceito dinâmico e determinante da vida psíquica é um dos pilares mais importantes da psicanálise e da psiquiatria. (Dalgalarrondo, 2008).

Diante ao exposto, para o psicanalista poder auxiliar, fornecendo pistas, questionamentos ao analisando, diante do sonho do mesmo, para que esse consiga se deparar com uma cena e disso possa tirar proveito, possa auxiliá-lo a organizar seus pensamentos e sentimentos, o profissional deve possuir uma sensibilidade altruísta, eu diria. Pois está lidando com uma vida fraturada, ou fantasiada, real ou não. Entretanto, são sintomas que machucam, “é fato” para quem sofre.

O tema interpretação dos sonhos, contextualizando com todos os conceitos da psicanálise até aqui estudados, utilizados não como uma justaposição de peças, porém, com toda a ética necessária, de fato, para auxiliar um sujeito a se encontrar, a se perceber, ser feliz é um instrumento valioso. Pois o sonho é uma atividade saudável.

 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e semiologia dos transtornos mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008.

MÓDULO 8. Curso de formação em psicanálise - psicanaliseclinica.com (2020)

REPRESENTAR. Disponível em : representar - Bing. Acesso: 28 set.21

SIMBOLOGIA. Disponível em simbologias - Bing. Acesso: 28 set.21

 

 

 

A necessidade e importância do silêncio pensante

                                                               Maria Helena

         De acordo com o Módulo 10 (2020) do curso de Psicanálise Clínica, o silêncio é a forma de resistência mais nítida e frequente que encontramos na prática psicanalítica. Assim, também como trata da importância da linguagem na identificação do outro.

       Neste viés, este texto se debruça, no sentido de confirmar que a linguagem possui em si o próprio silêncio, pois é a comunicação por signos, sinais.

      Estranhamente a expressão “escuta de silêncios” para mim é linda e, ao mesmo tempo, difícil, porque não fomos nem educados para ouvir o que o outro diz, normalmente esperamos a vez de falar. Assim, ouvir os ruídos externos só percebemos se, de alguma forma, eles nos afetam, quer por ser um som e volume que atrapalhe em nossos afazeres, quer um som que nos proporcione um bem-estar. 

       O texto de que trata do tema ainda indica: o silêncio é, assim, uma forma de intervenção do analista, que pode ser tanto passiva, quanto ativa, é uma ferramenta. Portanto, cabe ao analista observar-se, saber se consegue ouvir, perceber os tipos de silêncio para poder intervir. (MÓDULO 10, 2020)

        Mello (2021) adverte que o diálogo não acontece somente com palavras, pois se presume saber que o silêncio constitui a comunicação, porque é uma maneira de expressão. Silêncio é linguagem e intercala a conversação. No diálogo estão imbricados períodos de repouso e, também, momento de reflexão. A linguagem reduz, limita, pois não abrange certos sentidos, por vezes entendendo o silêncio como uma não linguagem. Assim, o silêncio não é um calar-se, e é sim um jeito de fala. O silêncio representa um limite das palavras, um espaço vago e, neste lugar, a imaginação dos sujeitos que estão se comunicando, podem criar possibilidades múltiplas.

         Na era das redes sociais, a comunicação é real, através de aparelhos, e são tantos os aplicativos, eu sei que existem, porém não utilizo, pois comunicam imagens, onde provavelmente o sujeito da selfie é assujeitado do sistema, portanto nem consegue refletir sobre sua vida e seu entorno.

     No citado cenário, quando conseguimos observar sem julgamentos e temos um olhar focado é possível perceber acontecimentos que, em princípio, parece banal, não natural. Pois para mim, natural é o que segue a natureza e aquilo que nossos olhos e ouvidos passam a se acostumar, se torna banal. Assim, ao ouvir o número de óbitos em acidentes de carro, determinada doença, inclusive a pandemia do COVID, as estatísticas tomam um lugar estratégico de anular as vítimas. Porque não ouvimos a realidade, mas um percentual aceito, pois foi previsto pela “ciência”. Uma observação focada tiraria a pessoa do lugar de assujeitado e um sujeito iria reagir, questionar, sentir a dor do outro. Por isso, o ouvir e o silenciar, na hora certa são provas que a pessoa está presente.

Coelho (2000) em seu Blog, apresenta: “Até o insensato passará por sábio, se ficar quieto, e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento. ” Provérbios 17:28. “Quem tem conhecimento é comedido no falar, e quem tem entendimento é de espírito sereno. ” Provérbios 17:27. Aqui observa-se que a espiritualidade tem um compromisso com o silêncio e estimula, inclusive a praticá-lo.

Pinheiro (2015) afirma que associado de forma banal à ausência da fala, o silêncio é, contudo, presença plena de significações: uma força complexa, que questiona a própria linguagem em seu uso social. Portanto, de fato, não conseguimos nem entender a comunicação por meio de silêncio, sendo uma ferramenta necessária para quem trabalha no aprimoramento de equipes, ou na função de um psicanalista.

Um fator importante e, por vezes, não nos damos conta é o poder do silêncio levar a pessoa a ter mais cautela, ser mais prudente em determinadas situações. Em contrapartida, pode ser usado para provocar, negar, censurar. E quando não se tem o que dizer, o silêncio diz tudo, desde que o interlocutor compreenda. É preferível ao não saber o que dizer, calar-se, do que falar em demasia, tentando comunicar algo que nem foi organizado internamente, em termos de pensamento.

No cotidiano, para desenvolvermos melhor a comunicação, é necessário não somente aprender um vocabulário mais rico, técnicas de fala, olhar o interlocutor nos olhos, é preciso reconhecer quando o silêncio deve fazer parte da comunicação. Silêncio não é escutar o outro, não é ficar quieto, obviamente isso é necessário para acolher o que o “outro” nos traz de informação, sem que eu contamine com os meus pensamentos, avaliações e críticas.

Escuta de silêncios, silenciar comunicando, ouvir a respiração do outro. Estar com a alma junto com o corpo, usar os sentidos, com o significado de conhecer o mundo, o interno e o externo. E se estamos com dificuldade em reconhecer os elementos do mundo externos, pois nos perdemos em conceitos, quando se trata da realidade, imaginem o acesso ao mundo interno, o inconsciente. Fico imaginando se o consciente sabe que deveria conhecer o inconsciente ou se assim está cômodo.

 

Referências Bibliográficas:

COELHO, Guilherme. 3 lições sobre o silêncio. (2020) disponível em: https://medium.com/@genevescoelho/3-li%C3%A7%C3%B5es-sobre-o-sil%C3%AAncio-4c7029b473e0. Acesso: 28/out./2021.

MÓDULO 10. Curso de psicanálise clínica. (2020).

PINHEIRO, Marina L.  M. Sobre silêncios e sua comunicação. Outras Palavras. (2015). Disponível em: https://outraspalavras.net/tecnologiaemdisputa/sobre-silencios-e-sua-comunicacao/ acesso: 28/out./2021.

MELLO, Renato de. O silêncio faz sentido. (UFMG). Disponível em: http://www.filologia.org.br/ileel/artigos/artigo_146.pdf. Acesso em: 31/out./2021

A Representação Social em um setting psicanalítico

                                                                 Maria Helena                                                     

            "Somos as palavras que trocamos, os enganos que cometemos e os impulsos a que cedemos”. (Sigmund Freud)

 Toda pesquisa parte de uma curiosidade e esta nasceu de um cenário propício ao encantamento da procura, do incômodo do querer buscar respostas. Estudar o homem, necessita compreendê-lo sob vários aspectos, pois é um ser individual, social, histórico e cultural.

 Este artigo se debruça sobre os aspectos relevantes estabelecidos na comunicação acontecida em um setting de psicanálise, tendo como seu objeto a representação social.

Embora haja muitas produções sobre a comunicação, a relevância deste tema não se esgota, devido a psicanálise atualmente estar presente em todas as classes sociais, econômicas e culturais, ainda ser analisada à luz da representação social em seu espaço íntimo analista-analisando.

   Os seres se comunicam de variadas formas e os humanos, por sua vez, possuem sua maneira específica.

   Não pode haver dicotomia entre um significante e o significado na comunicação, principalmente no aspecto conceitual, porquanto nem todo termo utilizado por um comunicador é compreendido por outrem, da mesma forma. Há um viés inédito e original neste texto, pela ênfase social, em um eixo que, por vezes, é compreendido na individualidade do e no analisando. Objetivo geral: Contextualizar o papel da Representação Social como elemento na comunicação em um setting de psicanálise. Específicos: Analisar o conceito de Representação Social; Compreender o contexto analista-analisando (setting); Especificar os elementos da comunicação em psicanálise.

   Para construir um tema é necessário se pautar em conhecimentos construídos anteriormente decorre e, por vezes, “no entrecruzar-se de muitos assuntos se pesca o peixe que se procurava”.  (MARQUES, 2001, p. 100).

  É uma pesquisa quanti-qualitativa, porque essa parte de levantamentos exploratórios na internet, para a indicação dos objetivos e firma-se na pesquisa bibliográfica.

1. Representação Social

 “Representações adquirem vida própria, circulam, se encontram, se atraem e se repelem e dão oportunidade ao nascimento de novas representações, enquanto velhas representações morrem”. O movimento faz parte do cotidiano, devido o ser humano, refletir pensar e buscar respostas. (MOSCOVICI, 2011, p. 41).

As Representações Sociais são um conjunto de crenças e saberes socialmente construídos e partilhados, saberes esses que nos permitem pensar, falar, tomar decisões, nos apropriarmos do mundo e dar-lhe sentido.

 Para Jovchelovitch (2008) a representação possui em si dimensões que são entendidas na complexidade e complementaridade no viés ontológico, epistemológico, social, cultural, histórico e psicológico. Em razão do ponto de vista do fenômeno, formam um sistema, estão interligados.

  Partindo dessa visão, não há como considerar isoladamente cada item designado, porque a sua razão de ser se encontra quando o colocamos em um continente para poder compreendê-lo. Ao mesmo tempo que a ciência é feita de homens para os homens, não é um constructo de seres refratários ao seu meio.

Continua Jovchelovitch (2008) indicando que a compreensão daquilo o qual as pessoas que comungam da mesma forma de comunicação, acontece por construírem os mesmos significados para os significantes. Porque suas relações concretas em grupo e no individual compartilham da cultura, da história, em suas relações sociais, produzem e reproduzem, o que lhe é simbólico, seja físico ou abstrato.

Para a referida autora o processo da representação social permite que um ser se perceba e se represente, possuindo, assim, a identidade. Promove a percepção objeto-mundo, também, na intersubjetividade possibilita a constituição histórica e cultural

Não há como negar que um conjunto de seres humanos comungam de crenças, valores, linguagens, símbolos para que se identifiquem e haja uma suposta segurança do pertencimento. Uma sociedade sem indivíduos que não reconheçam a sua história e, com ela, não se identifiquem, podem causar vários problemas ao grupo, e tornando esse, vulnerável.

Portanto, parte-se da prerrogativa, que os símbolos devem ser de conhecimento de todos, para que haja colaboração. Fato, assim, se entende também, que a qualquer ciência para poder estudar esses grupos, não pode isolá-los nem do seu contexto, isto é micro e, muito menos, de um nível macro.

Durante uma sessão de psicanálise se entrecruzam materiais, os quais devem ser observados com muita cautela.

2. O Setting: Minha História, Tua História

 Falar em Freud é tratar de psicanálise e lembrando essa, é indicar a associação livre que é a técnica utilizada para o desenvolvimento do objetivo da mesma.

É papel da técnica associação livre favorecer um vínculo entre analista e analisando, com a finalidade de compreender os processos reprimidos pelo subconsciente do paciente. Pois quando esse procura a psicanálise, está em busca de que seu sofrimento seja suprimido. Os recalques podem estar gerando seus sintomas como a angústia ou a ansiedade, mas precisa-se, também, lidar com os mecanismos de defesa.

  Para Oliveira (2020) os mecanismos de defesa surgem enquanto estratégias, para proteção da pessoa, para que a mesma consiga se manter sem sofrimento, sem o contato frequente com aquela demanda que está em seu inconsciente e se chegar ao consciente, lhe causará muito sofrimento.

     Segue a referida autora de que tais mecanismos são mobilizados frente a uma situação indicada como perigo, ou seja, reviver fatos, mesmo em memória que são dolorosos no qual o sujeito não está preparado para suportar. Portanto, permitir ao analisando que o mesmo se autoconheça, se preparando para encontrar os tais traumas é uma função da psicanálise.

Ao iniciar o tratamento pelas sessões de psicanálise, a técnica, a proposta de associação livre é comunicada ao analisando, porém esse não tem a obrigatoriedade em entendê-la e cumpri-la. No entanto, faz parte da ética humana e profissional do psicanalista conhecer e compreender a psicanálise em suas nuances para poder desenvolver um trabalho capaz de minimizar os sofrimentos e/ou "curar" o analisando.

 O tratamento analítico tem como base a comunicação entre analista e paciente. Parte-se do pressuposto que as comunicações do paciente, por meio de sua liberdade de fala, permitem a emergência de seus conteúdos inconscientes, podendo ou não, possuir um significado de acordo com a escuta e a interpretação efetuadas do analista.

      É intrínseco à psicanálise a própria forma de comunicar-se, porquanto analista e analisando, são tocados em suas mais intimas condições, por isso a importância da percepção da transferência.

      Para a psicanálise, em seu método de tratamento, Freud deixa a herança de que no ato de comunicar, o analista deve estar bastante atento à associação livre elaborada pelo analisando, durante uma sessão de análise. Portanto, cabe ao analista instruir o seu analisando para dizer tudo o que vem à mente, mesmo que lhe pareça uma bobagem. (MELLO, 2017)

 Para Freud as comunicações verbais do paciente são fundamentais, uma vez que era a partir dessas comunicações, e da escuta do analista, que o significado latente dos sintomas poderia ser revelado. Os sintomas, ao mesmo tempo em que mantem secretos e inacessíveis certos pensamentos e sentimentos, comunicam de modo distorcido, cabendo ao analista colocar-se disponível para acolher tais comunicações. (MELLO, 2017)

      Claro está que o analista não deve de antemão julgar, pressupor, diagnosticar, sem obter todos os elementos necessários, ainda a própria, análise por si, possui um elemento fundamental e filosófico, pautado na dialética, ou seja, movimento. Embora o material recalcado seja e esteja ali, a maneira como se acessa a ele, não é possível um planejamento rígido, à priori, por parte do analista. Portanto, a atenção flutuante serve para o analista ter, em sua consciência, essa percepção o tempo todo.

Toda a prática na vida de um sujeito decorre de uma teoria, sendo um processo intrínseco teoria e prática são movimentos dialéticos. Assim, é uma atividade, condição humana, portanto social.

O analista faz devolutivas ao analisando em forma de questionamentos, partindo das comunicações verbais, corporais, silêncios. Para tanto, a atenção a todos estes sinais, pistas valem para serem investigados, até onde está uma resistência, um sintoma, uma possível causa daquele sofrimento humano.

“A psicoterapia é um valioso recurso para lidar com as dificuldades da existência em todas as formas que o sofrimento humano pode assumir [...].” (MÓDULO 09, 2020, p. 05).

E isso não pode ser apenas uma frase bonita, que chamou a minha atenção. É profundamente uma percepção do que vem a ser os momentos que a psicoterapia pode favorecer de mais humano para uma pessoa que está com um sofrimento causado por suas emoções.

“A boa terapia se desenrola num enquadre clínico com um vínculo que favorece este processo. Aí está um dos segredos desta arte: criar um ambiente que permita a revelação dos mundos internos e favoreça o desenvolvimento do processo singular de cada um”. (MÓDULO 09, 2020, p. 10).

Percebe-se que não é qualquer profissional ou ambiente que conseguirá fazer com que um paciente, cliente, analisando, enfim uma pessoa se sinta tão à vontade, ao ponto de expressar sua mais profunda dor.

De acordo com o Módulo 09 (2020), a base de uma boa terapia está na relação terapêutica, quando se desenrola em uma harmonização cujo vínculo favorece o processo. O ambiente é um elemento fundamental, portanto, deve possibilitar que o mundo interno do analisando consiga emergir, ainda beneficiando o desenvolvimento da dinâmica da singularidade individual. Nesse clima, é possível ao ser mais oculto e amedrontado se mostrar, ser ouvido, transformar-se.

 Uma ferramenta fundamental é a atenção flutuante durante um encontro no setting, e isto exige do analista sustentar a posição de não saber de antemão o sentido da fala do paciente. É um esforço de não levar compreensões pré-construídas para as sessões e tomá-las como um filtro através do qual irá escutar a fala do paciente. O resultado disso é que o analista se torna mais disponível para o reconhecimento das manifestações do inconsciente. E a comunicação é uma ferramenta fundamental.

3. Comunicação, objeto, representação

Quando determinado grupo se engaja em torno de um fenômeno, de algo que lhe é concreto, a representação social que constroem de cada elemento, à priori, possui um significado para os significantes. Assim, é necessário a todos a compreensão da leitura desses dados que conformam a sua rede de elementos.

    O diálogo não acontece somente com palavras, pois se presume saber que o silêncio constitui a comunicação, porque é uma maneira de expressão. Silêncio é linguagem e se intercala à conversação. No diálogo estão imbricados períodos de repouso e, também, momento de reflexão.

Em um espaço de conversação sobre o sofrimento de uma pessoa, muitos elementos emergem, daquilo que Freud denominou de psique.

   Para Oliveira (2020) entre as exigências do id e as censuras do superego, o ego sente-se pressionado, defendendo-se com o medo, em razão de não poder se desestabilizar. Assim, os mecanismos de defesa surgem, porém devem ser percebidos pelo psicanalista porque esses podem modificar a forma como o sujeito se percebe. Outra observação é que a demanda apresentada pelo analisando é uma representação deformada da realidade.

   Diante disso, a atenção ao objeto da análise, a percepção intima do sujeito sobre os seus sentimentos, como esse traduz os mesmos em forma da linguagem.

  A linguagem reduz, limita, porque não abrange certos sentidos, por vezes entendendo o silêncio como uma não linguagem. Assim, o silêncio não é um calar-se, e é sim um jeito de fala. O silêncio representa um limite das palavras, um espaço vago e, neste lugar, a imaginação dos sujeitos que estão se comunicando, podem criar possibilidades múltiplas.

 Nas diferentes formas de linguagem, pode estar simplesmente repetindo, imitando, pois a proliferação dos meios de comunicação de massa e o impacto de práticas globalizadas, em arenas locais, intensifica os embates entre formas diferentes de se conhecer, diferenciar o que é real e o que é fantasia. Em nível individual e no coletivo levanta questões sobre como comunidades locais se apropriam dos acontecimentos, fatos, imbricados por emoções individuais.

Ao exposto precisa-se verificar em que base está a ciência que faz a análise do objeto. Quando se afirma que pode ser a partir de uma visão racionalizada, não significa dizer que a ciência ganha notórios de certeza, mesmo quando de manifestação publicizada. Significa que a informação passou por um determinado crivo, porém não necessariamente represente um coletivo.

Jovchelovitch (2008) assevera que para perceber a comunicação deve-se abrigá-la na intersecção das ciências que estudam o homem.  A não ser que essa seja reduzida a um elemento da linguagem humana.

A comunicação humana acontece na ação, na prática social, não é um em si para si. Portanto, desejar analisar a linguagem enquanto produto humano, enquanto objeto, devem estar claros até a reparação em determinados recortes históricos. Portanto, para melhor apreendê-la, faz-se necessário contextualizá-la. (JOVCHELOVITCH, 2008)

Prova disso é o que, atualmente, vivemos diante de informações cujas fontes são ‘ocultas’. Se isso gera insegurança por indivíduos que conseguem ter uma ação reflexivas, outros podem consumi-la, ou seja, sentir-se amparado porque entende estar atualizado.

Nesse quesito importa ao sujeito-psicanalista, analisar o próprio entorno. Para que no setting, possa compreender a partir de quais indicadores o seu analisando traz as mensagens, toda e qualquer forma de comunicação.


Conclusão

Foi oportuno realizar a pesquisa, verificar as fontes comparar autores, datas e chegar a uma conclusão, mesmo que momentânea.

Para se possuir uma visão parcial e limitada de um objeto, basta ver o próprio como parâmetro e para explicar um dado contextualizado se deve abarcar seus múltiplos aspectos. Perceber o maior número de elementos que compõe um objeto, se faz necessário uma visão ampliada.

É determinante a percepção dialética do movimento como processo e produto humano ou do humano. Nesse olhar, a comunicação, enquanto objeto pode ganhar uma representação que não emergiu do coletivo de maneira cultural. Contudo, regida por interesses direcionados de grupos que não se identificam historicamente com seus contemporâneos. Portanto, a reflexão constante sobre o objeto é imprescindível. Algumas conclusões sobre o tema pesquisado são evidenciadas.

Com relação às representações sociais, essas são formadas em um constructo social, cultural de crenças, conhecimentos sendo partilhados por um grupo que com ele se identifica, portando percebendo um mesmo significado para determinado significante. Como é o caso da comunicação, porque emissor e receptor conhecem o mesmo signo para iniciar um diálogo.

  A sessão de análise ultrapassa o par analítico, pois muitos outros elementos por ali transitam, entre eles: duas histórias com os seus referenciais, são sentimentos, emoções, sofrimento. De outra parte, permeado de emoções, existe uma expectativa do conhecimento daquele que conduz a sessão, no caso o analisando, uma vez que o psicanalista estará focado na associação livre que o analisando elabora. (setting).

O psicanalista cumpre o papel de ouvir sem julgamentos, com a atenção aos detalhes, porém sem estereótipos, não pressupor um diagnóstico, e não ser tendencioso norteando a análise de acordo com o próprio ego. Não deve ouvir o analisando pensando em encaixar os sintomas, as emoções em uma patologia. Mas prestando atenção nos detalhes de fala, gestos, sinais, pistas porque podem indicar a resistência, um sintoma, uma ansiedade, talvez a possível causa do sofrimento.

 No ato de dialogar cabe ao analista conhecer o enredo sócio cultural, e isso resulta da entrevista, para poder fazer as intervenções necessárias levando o analisando a refletir sobre o próprio pensar.

O método psicanalítico com a atenção flutuante e a associação livre,   conjugam um aporte metodológico e técnico de base para o trabalho do psicanalista, porque são os causadores iniciais, e necessários, para que uma experiência analítica possa acontecer. 

Para o psicanalista estar em um setting é preciso mais que um diploma, pois não há conclusão, a psicanálise é terminável e interminável, o tripé supervisão, estudo teórico e sua própria análise são essenciais a esse processo.


Referências bibliográficas

GIL, Antônio C. Como elaborar projetos de pesquisa. 5. ed. São Paulo: Atlas, 2010.

JOVCHELOVITCH, Sandra. Os contextos do saber: representações, comunidade e cultura. Petrópolis, RJ: Vozes. (2008).

MELO et al. As dimensões da comunicação na obra freudiana. Contextos Clínicos. (2017) Disponível em: disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/cclin/v10n2/v10n2a09.pdf. Acesso: 28/fev/ 2022. OLIVEIRA, Karla. Funcionamento dos mecanismos de defesa na Psicanálise. RJ: IBPC, 2020. Disponível em: https://www.psicanaliseclinica.com/funcionamento-mecanismos-de-defesa-psicanalise/ http://pepsic.bvsalud.org/pdf/cclin/v10n2/v10n2a09.pdf. Acesso: 28 fev. 2022.

PSICANÁLISE CLÍNICA. Módulo 09. Curso de psicanálise. 2020. Disponível em: https://membros.psicanaliseclinica.com/pratica2022-1-sa2h/