segunda-feira, 7 de outubro de 2024

AUTONOMIA DO SISTEMA MUNICIPAL DE ENSINO

 Autonomy of the municipal education system

Maria Helena

 Percebo a busca com tanto afinco pela autonomia, em todos os seus aspectos, porém quando um município em que constitui em sistema de ensino, possui tanta dificuldade em tentar desenvolver seu trabalho, dentro de seus limites, com base em suas leis e normativas, não faz um esforço político para acertar, é muito estranho.

Reconheço e possuo posts que tratam das questões de ordem culturais e políticas que “cristalizam” o processo, emperram, de fato. Contudo, gerenciar a educação de um município, cabe ao administrador, além do seu perfil de liderança, se pautar em conhecimento acerca de sua seara, pois isso lhe concede o certificado de autoridade.

Respeito, com certeza, a ideia de que se espelhar na forma como seu estado administra a educação valida as ações de um município, haja vista que, por muito tempo, havia uma subordinação, inclusive do conselho de educação municipal ao estadual. No entanto, com a Constituição de 1988 e a LDB, 1996, penso haver um tempo suficiente para tentar se apropriar do que aconteceu.

Vejamos, artigo 8º da LDB: “A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os respectivos sistemas de ensino.” Assim, fica evidente que o Brasil não possui um sistema federal de educação, mas regimes de colaboração. E como autonomia não é sinônimo de soberania, existe o MEC, cujo papel é a elaboração das políticas nacionais de educação, entre outras atribuições, como também existe o Conselho Nacional de Educação.

Diante ao exposto, voltamos `a LDB, competência do estado, entre outras, em seu inciso V: “baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;”, portanto, para o seu sistema, se determinado município não possui nenhum regime de colaboração, arranjo, cooperação, não deverá seguir essas normas. E se desejar seguir, deverá observar o que confere o RI do CME, para saber das possibilidades e, assim criar uma resolução posicionando-se publicamente naquilo que o Sistema de educação está seguindo. E o município, Art. 11, LDB, os Municípios incumbir-se-ão de, entre outros, “organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados; [...] baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;”.

Observe que chegamos a um Regimento Interno de um Conselho Municipal, portanto vejam, ao alinhar as normas e leis há um longo caminho que inicia pela CF 1998, passando pela LDB, Constituição Estadual, Lei Orgânica, Lei do Sistema de Educação/Ensino, normativas emanadas do CME, observe conselho não legisla, como pertence ao executivo, normatiza. Ainda temos outras leis federais, acessibilidade, ECA, código civil, e até de defesa do consumidor, não somente pelas escolas privadas. Vejamos uma situação que muito incomoda os gestores da educação, diz respeito à LDB e ao ECA. Inciso V, artigo 11, LDB – “oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.” Prioridade? Ensino fundamental, certo? Lembrando que a obrigatoriedade escolar no Brasil é de 4 a 17 anos. Vamos ao ECA: artigo 54, “§ 1º O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo. § 2º O não oferecimento do ensino obrigatório pelo poder público ou sua oferta irregular importa responsabilidade da autoridade competente. § 3º Compete ao poder público recensear os educandos no ensino fundamental, fazer-lhes a chamada e zelar, junto aos pais ou responsável, pela frequência à escola”. No mesmo artigo, inciso IV – “atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade;”. Não trouxe a questão da acessibilidade à informação e arquitetônica, crianças que necessitam de um ensino diferenciado, pois é direito subjetivo, constitucional direto à educação escolar.

LDB - inciso IV - do art. 5º: divulgar a lista de espera por vagas nos estabelecimentos de educação básica de sua rede, inclusive creches, por ordem de colocação e, sempre que possível, por unidade escolar, bem como divulgar os critérios para a elaboração da lista.   (Incluído pela Lei nº 14.685, de 2023)

Como atender o Art 54A do ECA IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a cinco anos de idade; (Redação dada pela Lei nº 13.306, de 2016)?

 Para o atendimento às mencionadas leis, o sistema municiapal em sua gestão deve estar constantemente revisando os documentos, atualizando suas normativas. Esse é apenas um assunto.

Neste imbróglio, de que se trata da educação escolar brasileira, onde frequentemente se cai na polêmica e não em buscas de soluções, os anos vão passando e poucos têm a coragem de descascar a “batata quente.”  De que vale a democracia, a gestão democrática, o número exagerado de conselhos, se a maioria que faz parte dos mesmos não optou por estar ali e não há um investimento do poder público em oferecer formação para estes conselheiros e gestores escolares.

O ambiente escolar, ocupa muito mais que a sua estrutura física, seu papel social alterou muito de um simples lugar de ensino, treino para um a compreensão ampla de educação. Não entrarei no mérito do assunto, pois possuo posts neste mesmo Blog.

Voltando ao tema, entendo ser difícil, e não complexo, quando entendemos todos os elementos que compõem a estrutura de um sistema. Não utilizar determinado município como modelo, pois este possui as suas peculiaridades, a sua história. É tempo de reescrever as memórias, estudar as possibilidades, trazer para a atualidade as leis de Sistemas dos anos 2000, 2007, 2013, etc... Verificar as Emendas Constitucionais a partir do ano 2000, e as atualizações da LDB e criação de leis federais que incidem diretamente na educação escolar, sobre as quais os conselhos de educação devem normatizar.

Lembrar a todo tempo que a autonomia demanda conhecimento, não se pode utilizar leis e normas de outro sistema sem que se assuma, isto respeitando as normativas internas e documentando por meio de atas, com assinaturas, datadas, arquivadas, não podem estar em palavras “soltas”, e-mails, WhatsApp. Enfatizando aqui, também, as leis da informação e da transparência. Foi o tempo que um livro de capa preta ostentava para alguns privilegiados as decisões, portanto, políticas, assumidas por tal Rede e/ou Sistema e/ou Conselhos.

A cada início de ano muitos gestores assumem secretarias de educação. Lembre-se, você trabalha para um projeto de educação e não para um partido político. Vamos dar mais um passo para concretizar a autonomia de que nós tanto discursamos.   


A necessidade e importância do silêncio pensante

    Maria Helena

         De acordo com o Módulo 10 (2020) do curso de Psicanálise Clínica, o silêncio é a forma de resistência mais nítida e frequente que encontramos na prática psicanalítica. Assim, também como trata da importância da linguagem na identificação do outro.

       Neste viés, este texto se debruça, no sentido de confirmar que a linguagem possui em si o próprio silêncio, pois é a comunicação por signos, sinais.

      Estranhamente a expressão “escuta de silêncios” para mim é linda e, ao mesmo tempo, difícil, porque não fomos nem educados para ouvir o que o outro diz, normalmente esperamos a vez de falar. Assim, ouvir os ruídos externos só percebemos se, de alguma forma, eles nos afetam, quer por ser um som e volume que atrapalhe em nossos afazeres, quer um som que nos proporcione um bem-estar. 

       O texto de que trata do tema ainda indica: o silêncio é, assim, uma forma de intervenção do analista, que pode ser tanto passiva, quanto ativa, é uma ferramenta. Portanto, cabe ao analista observar-se, saber se consegue ouvir, perceber os tipos de silêncio para poder intervir. (MÓDULO 10, 2020)

        Mello (2021) adverte que o diálogo não acontece somente com palavras, pois se presume saber que o silêncio constitui a comunicação, porque é uma maneira de expressão. Silêncio é linguagem e intercala a conversação. No diálogo estão imbricados períodos de repouso e, também, momento de reflexão. A linguagem reduz, limita, pois não abrange certos sentidos, por vezes entendendo o silêncio como uma não linguagem. Assim, o silêncio não é um calar-se, e é sim um jeito de fala. O silêncio representa um limite das palavras, um espaço vago e, neste lugar, a imaginação dos sujeitos que estão se comunicando, podem criar possibilidades múltiplas.

         Na era das redes sociais, a comunicação é real, através de aparelhos, e são tantos os aplicativos, eu sei que existem, porém não utilizo, pois comunicam imagens, onde provavelmente o sujeito da selfie é assujeitado do sistema, portanto nem consegue refletir sobre sua vida e seu entorno.

     No citado cenário, quando conseguimos observar sem julgamentos e temos um olhar focado é possível perceber acontecimentos que, em princípio, parece banal, não natural. Pois para mim, natural é o que segue a natureza e aquilo que nossos olhos e ouvidos passam a se acostumar, se torna banal. Assim, ao ouvir o número de óbitos em acidentes de carro, determinada doença, inclusive a pandemia do COVID, as estatísticas tomam um lugar estratégico de anular as vítimas. Porque não ouvimos a realidade, mas um percentual aceito, pois foi previsto pela “ciência”. Uma observação focada tiraria a pessoa do lugar de assujeitado e um sujeito iria reagir, questionar, sentir a dor do outro. Por isso, o ouvir e o silenciar, na hora certa são provas que a pessoa está presente.

Coelho (2000) em seu Blog, apresenta: “Até o insensato passará por sábio, se ficar quieto, e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento. ” Provérbios 17:28. “Quem tem conhecimento é comedido no falar, e quem tem entendimento é de espírito sereno. ” Provérbios 17:27. Aqui observa-se que a espiritualidade tem um compromisso com o silêncio e estimula, inclusive a praticá-lo.

Pinheiro (2015) afirma que associado de forma banal à ausência da fala, o silêncio é, contudo, presença plena de significações: uma força complexa, que questiona a própria linguagem em seu uso social. Portanto, de fato, não conseguimos nem entender a comunicação por meio de silêncio, sendo uma ferramenta necessária para quem trabalha no aprimoramento de equipes, ou na função de um psicanalista.

Um fator importante e, por vezes, não nos damos conta é o poder do silêncio levar a pessoa a ter mais cautela, ser mais prudente em determinadas situações. Em contrapartida, pode ser usado para provocar, negar, censurar. E quando não se tem o que dizer, o silêncio diz tudo, desde que o interlocutor compreenda. É preferível ao não saber o que dizer, calar-se, do que falar em demasia, tentando comunicar algo que nem foi organizado internamente, em termos de pensamento.

No cotidiano, para desenvolvermos melhor a comunicação, é necessário não somente aprender um vocabulário mais rico, técnicas de fala, olhar o interlocutor nos olhos, é preciso reconhecer quando o silêncio deve fazer parte da comunicação. Silêncio não é escutar o outro, não é ficar quieto, obviamente isso é necessário para acolher o que o “outro” nos traz de informação, sem que eu contamine com os meus pensamentos, avaliações e críticas.

Escuta de silêncios, silenciar comunicando, ouvir a respiração do outro. Estar com a alma junto com o corpo, usar os sentidos, com o significado de conhecer o mundo, o interno e o externo. E se estamos com dificuldade em reconhecer os elementos do mundo externos, pois nos perdemos em conceitos, quando se trata da realidade, imaginem o acesso ao mundo interno, o inconsciente. Fico imaginando se o consciente sabe que deveria conhecer o inconsciente ou se assim está cômodo.

 

Referências Bibliográficas:

COELHO, Guilherme. 3 lições sobre o silêncio. (2020) disponível em: https://medium.com/@genevescoelho/3-li%C3%A7%C3%B5es-sobre-o-sil%C3%AAncio-4c7029b473e0. Acesso: 28/out./2021.

MÓDULO 10. Curso de psicanálise clínica. (2020).

PINHEIRO, Marina L.  M. Sobre silêncios e sua comunicação. Outras Palavras. (2015). Disponível em: https://outraspalavras.net/tecnologiaemdisputa/sobre-silencios-e-sua-comunicacao/ acesso: 28/out./2021.

MELLO, Renato de. O silêncio faz sentido. (UFMG). Disponível em: http://www.filologia.org.br/ileel/artigos/artigo_146.pdf. Acesso em: 31/out./2021

sexta-feira, 30 de agosto de 2024

Eleições e Políticas da Educação

  

                                                                Maria Helena                              

          A filósofa brasileira Lúcia Helena Galvão afirma que aquilo que está por trás das mazelas e misérias humanas é o egoísmo humano, se for procurar no íntimo, é isso. Pauto minha escrita neste princípio: valores nobres em humanidade.

 Gostaria de ser otimista o bastante para acreditar que algumas plataformas de campanha eleitoral são leais e reais.

Estamos em um ano de muita seriedade, pois o País irá eleger os representantes, para comprovar que, de fato, fazemos parte de um cenário democrático.

Quando somos convidados ou chamados para representar alguém ou uma ideia, primeiramente devemos reconhecer o nosso nível de responsabilidade. Se o aceite nos colocará em uma situação clara para todos, ou o aceite traz apenas ganhos pessoais.

O Brasil é um país com grandes extensões, tanto geográficas quanto culturais, o que oferece um suporte para diferentes: valores, conceitos, interesses. Isso pode convergir em muitos conflitos.

Posso falar a partir da janela da área da Educação. Nossos futuros representantes não precisam fazer “promessas”, basta fazer o levantamento do número de leis (legislativo) que não foram colocadas em prática (executivo). Questionar os vários conselhos, para não ficar divulgando proposta que, além de não serem da sua alçada, estão previstas em leis. Fato, é muito incômodo ouvir este tipo de projeto. Não vou dizer que é engraçado, porque o assunto é muito sério.

Penso que não resolve citar PME, PEE, PNE ou os Fóruns, para isso há o acompanhamento e a avaliação. Dialogar sobre educação precisa ter o ouvir, o ver, o falar, pois escrever é muito fácil.

Ratificado, o País é continental, sabemos disso, outro fato, prometer criar um SNE - sistema nacional de educação – isso, quem está no interior das escolas, entende que não é a bala de prata, porque enquanto os sujeitos se importarem somente com as siglas partidárias ou com a sua cadeira, pouco mudará.  E há uma grande caminhada da própria categoria.

O que é necessário, neste momento, é fazer de algumas práticas, de algumas políticas terem força de lei. Usar dos vários órgãos competentes para aquilo que está na lei, seja cumprido. Não conversem somente com os dados, conversem com os fatos do chão das escolas, com os profissionais da educação. Pessoas: profissionais, estudantes e familiares têm sonhos, são brasileiros que os elegem.

Se não pensarem nas pessoas, pensem nos organismos externos fazendo advertências às unidades escolares e Redes públicas e/ou privadas.

Aquele candidato que tem em  seu projeto a educação escolar, certamente conhece o contexto.

Amor próprio não é egoismo

Self-love is not selfishness           

Maria Helena

  Este canal destina-se à formação continuada, não somente profissional, pois dentro deste, há um ser e, em tese, humano. Não uma humanidade pautada em uma visão daquele que possui inteligência, portanto se difere dos outros animais. É, sim, uma percepção de humanidade, que a cada dia busca se construir em um amor por si.

Nossa sociedade contemporânea, ainda, reproduz o contexto vivido na modernidade. Em nome da arte e do belo, ainda da espiritualidade, ou religião, muitos modelos imperam e, adequar-se aos padrões, nem tão discretamente pulverizados na sociedade, é um acordo tácito entre cidadãos. Eu entendo como um pacto entre mediocridades.

Somos seres sociais, precisamos dos outros por diversos fatores. Mas, para isso é necessário se reconhecer no cenário, o qual se vive. Ainda, se reconhecer nos potenciais, nas possibilidades que a vida oferece e perceber se está doando o melhor de si para si mesmo. Isso não é egoísmo, partindo do suposto que para amar ao outro eu devo ter desenvolvido um amor por mim. E isso significa o cuidado com a minha vida, respeito com os meus pertences. Saber que somos uma referência, enquanto ser humano, no nosso espaço social. Entender a necessidade da completude.

Iniciei dizendo que este é um canal de formação, reforçando agora essa compreensão da observação de si para além dos números de nossos documentos e títulos acadêmicos.

Entendo ser bastante difícil este mundo frenético de informações, gera um ambiente que, por vezes, escorregamos, esquecendo nossos valores mais sagrados, nossa essência.

Hoje não cabe procurar justificativas nas áreas de filosofia, psicologia, antropologia...é simples...é perguntar o que de bom, bonito, real eu tenho a oferecer para mim e para aqueles que encontro em qualquer ambiente ou situação.

O egoísmo está em quando eu imagino ser merecedor de um apreço maior do que os demais, quando não tenho a dimensão de quem eu represento para mim e os demais, desconhecendo as falhas, as incoerências que todo ser humano possui, pois está em busca do completar-se. O egoísmo dói, fere, machuca. O amor próprio cuida, cicatriza, compreende as próprias defesas.

A tão falada empatia, colocar-se no lugar do outro, para daquele lugar olhar o mundo e, então, tentar compreender o outro. Parece contraditório, porém as vezes nos colocamos no lugar dos outros e não nos colocamos em nosso lugar real, sem fantasias. Para eu cuidar do outro, devo saber cuidar de mim.

É um exercício diário, a cada dia, a cada dia, semana.. alimentar este cuidar de si. Aprender com a natureza, a paciência no desenvolvimento, as reservas para momentos de necessidade, a luz não somente para brilhar, mas para iluminar, o calor na medida certa, as estações, o escurecer para voltar-se para si, o amanhecer para recomeçar.

quarta-feira, 17 de janeiro de 2024

Formas de relacionamento e comunicação na sala de aula

  Forms of relationships and communication in the classroom space                                

                                                                      Maria Helena 

Este artigo é parte dos estudos realizados no curso avançado Especialista em Relacionamentos (IBPC). Objetiva refletir sobre as formas de comunicação em sala de aula. A base teórica se encontra nas aulas dos cursos: Relacionamentos; Personalidade; Psicanálise e Supervisão. Ainda demais reflexões elaboradas a partir de outros autores.

Os quatro tipos de relacionamentos considerados não saudáveis são: a) Tóxicos, onde oscila o autoritarismo entre os dois envolvidos, há momentos em que um está no “poder”, momentos em que o outro assume este “poder”. b) Abusivos, onde um somete abusa de seu suposto poder e o outro se subjuga a isso. c) Dependência Emocional, aquele em que um deposita toda a sua autonomia no outro. d) Disfuncionais, aquele em que prevalece a indiferença entre ambos.

Para considerar um tipo de relacionamento se deve observar muitos indicadores: perfil de personalidade, mecanismos de defesa, prevalência da psique, se feminino, masculino. Um indicador principal é o sofrimento do ser e a sua percepção de sua história, se está se reconhecendo, como é em sua essência.

Os relacionamentos entre seres humanos podem ser:  familiar, casal, pai-filho, mãe-filho, irmãos; no trabalho: colegas, chefia, subordinados. Dependendo do ambiente, mudam muitos apontadores. Verificar o relacionamento deste sujeito, como se comporta em casa, com os amigos, no ambiente de trabalho. Portanto, não é possível simplesmente ouvir do sujeito, comparar com uma tabela e pontuar um tipo de relacionamento, se tóxico, abusivo, disfuncional ou dependente. Se faz necessário um estudo completo, percebendo a complexidade de elementos.

Assim, os relacionamentos possuem histórias próprias. Aqui farei um recorte sobre a relação professor-estudante, há um relacionamento específico. O professor é um profissional, formado para o ensino, contudo, a concepção do papel social da escola, tem se transformado muito, assim como a ciência.

O papel docente no emaranhado sócio-histórico é crucial, porque para além do conhecimento didático, metodológico, há que se pensar que subjacente a isto há um posicionamento político e filosófico.

Para Moscovici (2007) a visão do social ultrapassa o conceito de coletivo. Se a psicologia social revela o pensamento científico pressupondo que os sujeitos se utilizam somente do cognitivo, essa visão científica, se torna limitante. Um sujeito possui reações que lhe são próprias, não há possibilidade em seguir uma dimensão rígida, pois há transformação não somente na natureza, mas nas formas de encarar fatos e situações.

Em cursos de formação docente há um item importante que é a comunicação. A linguagem, permite que as relações e os afetos sejam compreensíveis, através das palavras. Além disso, o pensamento e a linguagem, mesmo sendo habilidades diferentes oferecem sentido às expressões linguísticas. Assim, para Freud, a linguagem é um fenômeno necessário para a realidade humana.

Na sociedade contemporânea, onde a individualidade deu lugar ao egoísmo, manter um relacionamento harmônico está bastante complexo. Há uma relação de poder implícita, principalmente no ambiente de trabalho.

Uma sociedade é formada por vários minigrupos, que se agregam conforme uma identidade mútua entre esses elementos, assim, sentem-se representados pelos mesmos. Não significa afirmar que um indivíduo ou subgrupo aceita os pontos de vista de um grupo e dos que o representam. “Toda opinião diverge, todo juízo diferente representa um desvio em relação ao que é real e verdadeiro. Inevitavelmente é o que acontece quando o juízo emana de um indivíduo ou de um subgrupo minoritário.” (Moscovici, 2011, p.15

De acordo com Jovchelovitch, não existe uma simetria ao transmitir informações, pois não há uma passividade, há interação. Acreditar em conhecimento absoluto, científico ou não cristaliza o ato de conhecer. “Os processos representacionais são uma conquista da comunicação”. (2008, p.177)

O sujeito necessita ter consciência de si e a perspectiva do outro sem trazer para o diálogo somente as suas. “É no diálogo e na comunicação entre diferentes saberes que reside o potencial para decidir o que é certo ou errado, verdadeiro ou falso, aceitável ou inaceitável.” (Jovchelovitch, 2008, p. 211)

No espaço escolar, vislumbra-se que a comunicação tenha uma fluência harmônica, devido a formação acadêmica do docente. Contudo, aprender a comunicar acontece desde a vida infantil deste professor/a. A formação acadêmica não consegue desfazer isto, enquanto não houver a percepção de si, daquele que comete a ação.

Em uma sala de aula o objetivo é a aprendizagem do estudante. Há um planejamento das atividades, contudo é a comunicação que transversaliza o processo de ensinar.

O/A professor/a é um ser humano e, como tal, passou pelo seu desenvolvimento psicossexual, de acordo com a psicanálise freudiana. Portanto, este profissional adulto pode ter muitas feridas escondidas, se utilizando, por vezes, de muitos mecanismos de defesa. Este ser complexo, continua com sua personalidade, independente da formação acadêmica. Assim, a estrutura cerebral, biológica do homem e da mulher, bem como a psiquê feminina e psiquê masculina, (aqui não se trata de gênero) baliza o comportamento do sujeito.

Diante ao exposto, os relacionamentos que acontecem em salas de aula, em que o/a docente deveria ser o “adulto” da relação, percebe-se que, muitas vezes não exerce esse papel, mesmo que esteja trabalhando com crianças e adolescentes. Pois este “adulto” pode trazer a sua criança ferida à tona.

Quando se trata de salas de aulas de jovens e adultos, com relação ao comportamento do estudante, espera-se maior responsabilidade e autonomia desse, no entanto, pode haver ali muitas “crianças feridas” lidando com suas dores, tentando se defender e, uma aula baseada em diálogo, pode tornar-se em relacionamentos: abusivos, tóxicos, dependentes e disfuncionais. Situações nas quais nem docente e nem estudante conseguem se manter em um papel de adulto.

Assim, em muitas salas de aula onde o desrespeito impera, há uma indicação em que não há um relacionamento saudável, existe, sim, muito sofrimento. E a escola, no geral, não percebe a situação desta forma. Por não haver programas de formação continuada ao docente, neste sentido, o docente possui dificuldade em lidar com situações, em que a sua criança ferida é colocada em “xeque”, e esse acaba reproduzindo as expectativas indicadas pela sociedade. Há um distanciamento grande entre as produções teóricas e o fato: crianças feridas pedindo ajuda.

As escolas precisam incluir o docente como ser humano, não somente cognitivo. A empatia por tais profissionais precisa ser a emocional, para poder contribuir em seu desenvolvimento humano.

 

Referências bibliográficas:
GUARESCHI, P. A.; Amon, D.; Guerra, A. (2017). Psicologia, comunicação e pós-verdade. Florianópolis: ABRAPSO.
JOVCHELOVITCH, S. (2008). Os contextos do saber: representações, comunidade e cultura. Petrópolis, RJ: Vozes.
MOSCOVICI, Serge. Representações sociais: investigações em psicologia social. Petrópolis: RJ, 2007.

IBPC -Instituto Brasileiro de Psicanálise Clínica