Maria Helena
De acordo com o Módulo 10 (2020) do curso de Psicanálise Clínica, o silêncio é a forma de resistência mais nítida e frequente que encontramos na prática psicanalítica. Assim, também como trata da importância da linguagem na identificação do outro.
Neste viés, este texto se debruça, no sentido de confirmar que a linguagem possui em si o próprio silêncio, pois é a comunicação por signos, sinais.
Estranhamente a expressão “escuta de silêncios” para mim é linda e, ao mesmo tempo, difícil, porque não fomos nem educados para ouvir o que o outro diz, normalmente esperamos a vez de falar. Assim, ouvir os ruídos externos só percebemos se, de alguma forma, eles nos afetam, quer por ser um som e volume que atrapalhe em nossos afazeres, quer um som que nos proporcione um bem-estar.
O texto de que trata do tema ainda indica: o silêncio é, assim, uma forma de intervenção do analista, que pode ser tanto passiva, quanto ativa, é uma ferramenta. Portanto, cabe ao analista observar-se, saber se consegue ouvir, perceber os tipos de silêncio para poder intervir. (MÓDULO 10, 2020)
Mello (2021) adverte que o diálogo não acontece somente com palavras, pois se presume saber que o silêncio constitui a comunicação, porque é uma maneira de expressão. Silêncio é linguagem e intercala a conversação. No diálogo estão imbricados períodos de repouso e, também, momento de reflexão. A linguagem reduz, limita, pois não abrange certos sentidos, por vezes entendendo o silêncio como uma não linguagem. Assim, o silêncio não é um calar-se, e é sim um jeito de fala. O silêncio representa um limite das palavras, um espaço vago e, neste lugar, a imaginação dos sujeitos que estão se comunicando, podem criar possibilidades múltiplas.
Na era das redes sociais, a comunicação é real, através de aparelhos, e são tantos os aplicativos, eu sei que existem, porém não utilizo, pois comunicam imagens, onde provavelmente o sujeito da selfie é assujeitado do sistema, portanto nem consegue refletir sobre sua vida e seu entorno.
No citado cenário, quando conseguimos observar sem julgamentos e temos um olhar focado é possível perceber acontecimentos que, em princípio, parece banal, não natural. Pois para mim, natural é o que segue a natureza e aquilo que nossos olhos e ouvidos passam a se acostumar, se torna banal. Assim, ao ouvir o número de óbitos em acidentes de carro, determinada doença, inclusive a pandemia do COVID, as estatísticas tomam um lugar estratégico de anular as vítimas. Porque não ouvimos a realidade, mas um percentual aceito, pois foi previsto pela “ciência”. Uma observação focada tiraria a pessoa do lugar de assujeitado e um sujeito iria reagir, questionar, sentir a dor do outro. Por isso, o ouvir e o silenciar, na hora certa são provas que a pessoa está presente.
Coelho (2000) em seu Blog, apresenta: “Até o insensato passará por sábio, se ficar quieto, e, se contiver a língua, parecerá que tem discernimento. ” Provérbios 17:28. “Quem tem conhecimento é comedido no falar, e quem tem entendimento é de espírito sereno. ” Provérbios 17:27. Aqui observa-se que a espiritualidade tem um compromisso com o silêncio e estimula, inclusive a praticá-lo.
Pinheiro (2015) afirma que associado de forma banal à ausência da fala, o silêncio é, contudo, presença plena de significações: uma força complexa, que questiona a própria linguagem em seu uso social. Portanto, de fato, não conseguimos nem entender a comunicação por meio de silêncio, sendo uma ferramenta necessária para quem trabalha no aprimoramento de equipes, ou na função de um psicanalista.
Um fator importante e, por vezes, não nos damos conta é o poder do silêncio levar a pessoa a ter mais cautela, ser mais prudente em determinadas situações. Em contrapartida, pode ser usado para provocar, negar, censurar. E quando não se tem o que dizer, o silêncio diz tudo, desde que o interlocutor compreenda. É preferível ao não saber o que dizer, calar-se, do que falar em demasia, tentando comunicar algo que nem foi organizado internamente, em termos de pensamento.
No cotidiano, para desenvolvermos melhor a comunicação, é necessário não somente aprender um vocabulário mais rico, técnicas de fala, olhar o interlocutor nos olhos, é preciso reconhecer quando o silêncio deve fazer parte da comunicação. Silêncio não é escutar o outro, não é ficar quieto, obviamente isso é necessário para acolher o que o “outro” nos traz de informação, sem que eu contamine com os meus pensamentos, avaliações e críticas.
Escuta de silêncios, silenciar comunicando, ouvir a respiração do outro. Estar com a alma junto com o corpo, usar os sentidos, com o significado de conhecer o mundo, o interno e o externo. E se estamos com dificuldade em reconhecer os elementos do mundo externos, pois nos perdemos em conceitos, quando se trata da realidade, imaginem o acesso ao mundo interno, o inconsciente. Fico imaginando se o consciente sabe que deveria conhecer o inconsciente ou se assim está cômodo.
Referências Bibliográficas:
COELHO, Guilherme. 3 lições sobre o silêncio. (2020) disponível em: https://medium.com/@genevescoelho/3-li%C3%A7%C3%B5es-sobre-o-sil%C3%AAncio-4c7029b473e0. Acesso: 28/out./2021.
MÓDULO 10. Curso de psicanálise clínica. (2020).
PINHEIRO, Marina L. M. Sobre silêncios e sua comunicação. Outras Palavras. (2015). Disponível em: https://outraspalavras.net/tecnologiaemdisputa/sobre-silencios-e-sua-comunicacao/ acesso: 28/out./2021.
MELLO, Renato de. O silêncio faz sentido. (UFMG). Disponível em: http://www.filologia.org.br/ileel/artigos/artigo_146.pdf. Acesso em: 31/out./2021
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